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Territórios, armas: 6 perguntas que ainda pairam sobre a guerra na Ucrânia

Já em seu sexto mês, a guerra da Rússia na Ucrânia tem, hoje, poucas perspectivas de ser encerrada em breve. Suas consequências, porém, já estão claras até para além das fronteiras. Uma das principais são os efeitos das sanções econômicas, em especial na Europa, no que diz respeito ao fornecimento de gás.

Internamente, Kiev lida com uma ocupação pelas forças do presidente russo, Vladimir Putin, que não dão sinais de recuar dos territórios já ocupados. Soma-se a isso uma incerteza do que será da política da Ucrânia, hoje comandada por Volodymyr Zelensky, uma vez que o conflito chegar ao fim.

UOL ouviu especialistas para encontrar respostas a sete questões que ainda pairam sobre o conflito, que, hoje (31), chegou ao seu 158º dia.

1-) A Ucrânia irá conseguir recuperar os territórios hoje ocupados pela Rússia?

Dificilmente será possível a Kiev reintegrar essas áreas, que já somam 20% do território do país. Por um lado, há a estratégia russa de instalar equipamentos militares perto da usina nuclear de Zaporizhzhia e em bairros residenciais, destaca Vitélio Brustolin, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense e da Universidade Harvard.

“Para a Ucrânia conseguir retomar essas áreas, ela precisa usar artilharia dentro das cidades”, explica Brustolin. “Ficaria muito ruim para quem fornece armas para Kiev que elas começassem a ser usadas contra civis no próprio país.”

Por outro lado, aponta Héctor Saint-Pierre, professor da Unesp e fundador do Gedes (Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional), Kiev já se encontra com pouco material bélico, e seus parceiros ocidentais —ou seja, União Europeia e EUA— começam a se preocupar. “Abastecer a Ucrânia está começando a desabastecer, em termos militares, a própria segurança [desses países]”, sublinha.

 

Mapa Rússia invade a Ucrânia - 26.02.2022 - Arte UOL - Arte UOL
Imagem: Arte UOL

 

2-) O leste da Ucrânia mantém seu apoio à Rússia?

Sim, e isso é outra dificuldade imposta a Kiev na recuperação dos territórios, pontua Angelo Segrillo, professor de história da USP e especialista em Rússia. Na região, há uma grande quantidade de russos étnicos, muitos dos quais apoiam o governo de Vladimir Putin.

“Acho que o leste vai continuar com a Rússia porque a Ucrânia não tem poder bélico o suficiente para recuperar aqueles territórios”, explica. “Se tiver muita sorte, muito armamento, pode evitar que os russos expandam muito além desses territórios que já estão controlados.”

 

 

3-) Como os russos lidam com as sanções?

Do outro lado da fronteira —ao menos aquela definida antes do início do conflito—, a Rússia tem sido alvo de diferentes sanções do ocidente, além de ter visto a saída de empresas estrangeiras. O país, no entanto, dá sinais de ter se habituado à nova realidade.

“A Rússia conseguiu mais ou menos se adaptar às condições com várias medidas de emergência, mas o dia a dia, fora a falta de alguns produtos estrangeiros, está funcionando”, relata o pesquisador da USP. “[Os russos] Estão mais ou menos conseguindo se adaptar no curto prazo. Agora, essas adaptações vão pesar na economia no longo prazo”, acrescenta.

Saint-Pierre sublinha que muitos desses serviços estrangeiros foram substituídos por correspondentes locais, e Moscou dá sinais de que estava preparada para um cenário do tipo. O pesquisador destaca, porém, que os impactos têm sido muito maiores no Ocidente.

“No início, eu já apontava que o tempo iria correr a favor da Rússia, e que a Europa iria sentir os efeitos das sanções, que não estavam afetando Moscou tão profundamente quanto se supunha”, afirma. “A Rússia conseguiu debilitar o dólar no mercado internacional. O Ocidente não apenas não se fortaleceu [durante a guerra], como está se exaurindo.”

4-) A Europa está pronta para enfrentar o inverno com menos gás?

Sinal mais evidente do risco imposto ao Ocidente é a insegurança no fornecimento de gás. A União Europeia já anunciou uma meta de redução de 15% no consumo desde agora, em plena onda de calor, para tentar garantir algum estoque para o inverno.

“Eles [europeus] vão ficar bastante vulneráveis”, ressalta Segrillo. “É uma arma muito forte faltar o gás no inverno. É difícil porque já existem os gasodutos construídos, e levar liquefeito não é tão fácil assim de uma hora para outra.”

Esse contexto pode trazer consequências principalmente para as moradias populares na Alemanha, onde o gás russo garante cerca de metade da demanda.

 

 

5-) Há perspectivas concretas de a Ucrânia ingressar na União Europeia e na Otan?

No momento, o ingresso em blocos ocidentais dificilmente ocorrerá no curto prazo. Por um lado, a participação na Otan, que já estava na gaveta desde o conflito na Geórgia em 2008, estava descartada com a anexação da Crimeia e o início da guerra no Donbass em 2014. Isso porque a aliança militar ocidental não aceita a integração de países em guerra.

Além disso, é preciso da aprovação dos membros do bloco, que conta com Turquia —cujo presidente, Recep Tayyip Erdogan, será recebido por Putin em agosto. Ancara, por exemplo, impôs dificuldades para a recente entrada de Suécia e Finlândia (que possui 1.300 quilômetros de fronteira com a Rússia).

O caso da União Europeia é mais complicado. Pessoas ligadas ao Ministério das Relações Exteriores da Alemanha destacam a dificuldade do processo, que não deve ocorrer no curto prazo. O pesquisador Brustolin também ressalta como é demorado esse trâmite, dando o exemplo da própria Turquia, que aguarda desde 2019 o sinal verde.

 

 

6-) O que esperar do governo ucraniano no pós-guerra?

Atualmente, é difícil responder a essa pergunta, afirma Brustolin. Para além da anexação dos territórios, o que Putin busca na guerra é uma “Ucrânia obediente como é Belarus”, de Aleskandr Lukachenko, explica o pesquisador.

Kiev já teve um governo pró-Moscou, derrubado em 2014. Após isso, o país incluiu em sua Constituição a intenção de integrar a UE e a Otan, o que incomodou o Kremlin.

O que é quase certo, neste momento, é que o cenário político do país será complicado, afirma Segrillo. “Talvez fique mais homogênea, porque vão sobrar apenas os ucranianos étnicos mesmo”, pondera o professor da USP. “Então acho que a política ucraniana vai ficar mais pró-europeia ainda, e contra a Rússia”, em um desafio ao objetivo de Putin.

Fonte: UOL

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