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Papa diz que Mediterrâneo virou “cemitério” e cobra UE

papa Francisco pediu neste sábado (23/09) à União Europeia (UE) que faça um acolhimento justo dos migrantes que chegam de forma irregular no bloco e, “na medida do possível, amplie as entradas legais”, uma vez que “a rejeição não é a solução”.

A declaração foi feita em Marselha, no sul da França, em um evento que contava com a presença do presidente francês, Emmanuel Macron. O papa estava em visita oficial à França, na qual priorizou o tema da imigração em seus discursos.

“O Mediterrâneo deixou de ser o berço da civilização para se tornar o túmulo da dignidade. É o grito abafado dos irmãos e irmãs imigrantes”, disse o papa perante uma audiência que também incluía o ministro do Interior francês, Gérald Darmanin, a presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, e a vice-presidente da Comissão Europeia, Margaritis Schinas.

“Contra o terrível flagelo da exploração dos seres humanos, a solução não é rejeitar, mas garantir, na medida das possibilidades de cada um, um amplo número de entradas legais e regulares, sustentáveis ​​graças a um acolhimento justo por parte do continente europeu, no âmbito da cooperação com os países de origem”, propôs.

Na sexta-feira, o papa também havia dito que “este lindo mar tornou-se um enorme cemitério, onde muitos irmãos são privados do seu direito a uma sepultura”. Francisco destacou que vários portos do Mediterrâneo estão fechados para a chegada de migrantes e “duas palavras ressoam, alimentando os temores das pessoas: invasão e emergência”.

Ele rechaçou o uso do termo invasão, porque “quem arrisca a vida no mar não invade, busca abrigo”. Quanto à emergência, disse que “o fenômeno migratório não é tanto uma urgência momentânea, sempre oportuna para suscitar propaganda alarmista, mas uma realidade do nosso tempo”.

De janeiro a julho, 176 mil pessoas tentaram entrar na UE de forma irregular. É maior o número desde 2016, quando havia a crise de refugiados da Síria. 

Disputa na União Europeia

A questão dos migrantes está na agenda de prioridades da UE, em especial devido ao aumento da chegada de migrantes indocumentados à Itália e à Grécia, que fazem uma arriscada viagem por mar saindo de países do Norte da África.

Na Itália, o governo da primeira-ministra de ultradireita Giorgia Meloni declarou estado de emergência devido à chegada de imigrantes, e tem sido criticado por cercear os direitos desses pessoas e impedir missões de resgate no mar.

Até o momento, cerca de 120 mil imigrantes chegaram ao Itália neste ano, e nos últimos dias houve uma crise humanitária na pequena ilha de Lampedusa, onde em poucos dias chegaram cerca de 10 mil pessoas, que foram amontoadas em centros de acolhimento com capacidade para não mais que 300.

Diante dessa situação, a ilha recebeu a visita da primeira-ministra italiana e da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que anunciaram um plano de ação para tentar conter a imigração e compartilhar a gestão das transferências de imigrantes que chegam ao litoral italiano.

Distribuição dos requerentes de asilo

As Diretrizes de Dublin, que regulam o processo de asilo na UE, estabelecem que o primeiro país-membro que registrou as impressões digitais dos requerentes é o responsável pela análise do pedido. Depois, há procedimentos para distribuir aqueles que tiveram seu pedido aprovado entre os demais países do bloco.

Essa regra é criticada por países que têm fronteiras externas da UE, como a Itália, e por algumas organizações civis, que argumentam que esse modelo aumenta a pressão sobre essas nações.

Tenda da Cruz Vermelha em Lampedusa, com diversos migrantes ao redor
Cruz Vermelha italiana administra o centro acolhimento de migrantes em LampedusaFoto: Alessandro Serrano/AFP/Getty Images

Neste mês de setembro, a Alemanha e França suspenderam por completo o acolhimento voluntário de migrantes registrados na Itália. Em 2022, 3.500 foram transferidos do país mediterrâneo para outras nações da UE. Destes, em torno de mil foram para a Alemanha.

O ministro italiano do Interior, Matteo Piantedosi, reagiu com calma à decisão dos parceiros europeus, uma vez que essa estratégia não era de grande valia para o país. Ele confirmou que a Itália não adota mais as Diretrizes de Dublin.

Somente uma minoria dos migrantes que chegaram à Itália neste ano teve suas impressões digitais registradas e entrou com pedidos de asilo no país, segundo o Ministério do Interior em Roma. A maioria deseja viajar para o norte, até países como Alemanha, França ou Áustria. Os centros de acolhimento não são fechados, e os migrantes podem deixar o local por conta própria.

Alemanha também está no limite, diz presidente

Na última quarta-feira, o presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, também disse que seu país está tendo dificuldades em acolher mais imigrantes: “A Alemanha, assim como a Itália, está no limite de sua capacidade“.

Frisando que a Alemanha recebeu um terço de todas as solicitações de asilo da UE na primeira metade de 2023, o político social-democrata reconheceu que ambos os países têm “cargas pesadas para arcar” e apelou por uma “distribuição justa” do volume migratório dentro da Europa.

Diversos políticos alemães pleiteiam um teto máximo para o número anual de migrantes e requerentes de asilo. O líder oposicionista Friedrich Merz, da conservadora União Democrata Cristã (CDU), propôs um limite de 200 mil por ano – sugestão rejeitada pela ministra do Interior, Nancy Faeser, do Partido Social-Democrata (SPD), do chanceler federal Olaf Scholz.

Segundo dados oficiais, o país recebeu cerca de 175 mil solicitações de asilo em 2023, excetuados os ucranianos. Paralelamente, a Alemanha já recebeu mais de 1 milhão de refugiados da Ucrânia, que são submetidos a um processo especial de asilo, em face da guerra de agressão da Rússia.

Ao mesmo tempo, Berlim está tentando atrair imigrantes para preencher cerca de 2 milhões de vagas de trabalho. Em junho, foi aprovada uma reforma da lei de imigração com o fim de facilitar o ingresso de mão de obra qualificada.

Deutsche Welle – bl (EFE, Lusa, DW, ots)

Foto: The Vatican Media/AFP

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