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Onde os direitos LGBTQ retrocedem no mundo

Enquanto em diversos países a comunidade LGBTQ conquista e consolida direitos – como maior visibilidade pública, o reconhecimento do matrimônio homossexual ou a medidas antidiscriminatórias para indivíduos trans –, em outras partes a roda da aceitação e tolerância gira ao contrário.

A seguir, um panorama de retrocesso e polarização nas causas LGBTQ, em três continentes. E não se trata apenas das sociedades tradicionalmente consideradas mais retrógradas.

EUA: “Don’t say gay” como trunfo de campanha

O fato de que içar uma bandeira de arco-íris seja motivo para morrer a tiros é um triste nadir na luta pelos direitos LGBTQ nos Estados Unidos. Esse foi o destino de uma dona de butique da Califórnia, de 66 anos, no decorrer de uma discussão com um homem sobre uma bandeira de orgulho gay. O assassino foi posteriormente abatido num confronto com a polícia.

Na assim chamada “Terra da Liberdade”, governos estatais republicanos parecem competir para ver quem introduz mais leis anti-LGBTQ. O candidato presidencial e governador da Flórida Ron DeSantis tenta ganhar pontos junto ao eleitorado com a lei que os críticos apelidaram “Don’t say gay” (Não diga “gay”), a qual proíbe a discussão de orientação sexual ou identidade de gênero nas escolas do estado. Educadores que desafiarem a interdição correm risco de perder a licença profissional.

O Mississipi faz manchetes propondo as legislações mais homo- e transfóbicas dos EUA em 2023. Está proibido praticar cirurgias de redesignação de gênero (gender reassignment) em menores de 18 anos. Os infratores estão expostos a penalidades severas, inclusive a perda da licença médica.

Dakota do Sul, Geórgia, Iowa, Ohio e Virgínia Ocidental aprovaram leis semelhantes. O Texas classifica os procedimentos de redesignação de gênero como abuso infantil, estando os pais sujeitos a inquérito criminal.

O Tennessee tornou-se o primeiro estado americano a banir as apresentações de drag queens em locais públicos ou em qualquer sítio onde haja menores de 18 anos. A pena para uma primeira infração chega a um ano de cárcere.

Rússia: Protegendo “valores tradicionais”

Parlamentares russos justificaram como salvaguarda contra “ideologia ocidental antifamília” uma nova legislação coibindo a redesignação de gênero. Segundo seus apoiadores, banir tanto “intervenções médicas visando mudar o sexo de um indivíduo”, quanto a possibilidade de alterar a identidade de gênero em documentos oficiais sustentaria os “valores tradicionais da Rússia.

Casamentos em que um dos cônjuges mudou o gênero serão anulados, e transgêneros não têm permissão de acolher ou adotar crianças. Em dezembro de 2022, o presidente Vladimir Putin assinou uma lei interditando o que tachou de “propaganda LGBTQ“: qualquer expressão de vida queer em público, online, em filmes, livros ou na publicidade.

Hungria: Orbán rebate “ofensiva LGBTQ da UE”

A Hungria costumava ser considerada o país mais liberal do Leste Europeu, tendo descriminalizado a homossexualidade já na década de 1960. Sob o primeiro-ministro Viktor Orbán, contudo, suas leis vêm se tornando progressivamente restritivas.

Uma delas encoraja delação anônima de casais do mesmo sexo que tenham filhos. Desde 2019, a Constituição húngara estipula que o casamento só é possível entre um homem e uma mulher; e que a mãe e o pai devem ser, respectivamente uma mulher e um homem cisgênero.

Em sua retórica inflamada em questões queer, Orbán recentemente advertiu contra uma “ofensiva LGBTQ” supostamente empreendida pela União Europeia. Desde 2021 seu governo proibiu que menores de idade sejam informados sobre homossexualidade ou redesignação de gênero. A Comissão Europeia reagiu impondo medidas disciplinares a Budapeste.

Itália: Meloni contra barrigas de aluguel

Na Itália, o governo populista de direita de Giorgia Meloni tem igualmente visado as famílias LBGTQ. Mesmo antes de ser eleita, em setembro de 2022, ela já vinha denunciando o “lobby gay”.

Desde março, os prefeitos municipais italianos estão proibidos de registrar casais homossexuais como genitores. Em junho, o procurador-geral da cidade de Pádua ordenou a revogação do registro civil de uma das duas mães de uma garota de cinco anos de idade.

A ultradireitista Meloni também está adotando a linha-dura contra a maternidade por substituição (barriga de aluguel). Proibida na Itália, a prática está sujeita a penalização mesmo que concepção e parto se realizem em outro país. As penas draconianas previstas chegam a 1 milhão de euros de multa e até dois anos de prisão.

Uganda: Pena de morte para a homossexualidade

Em grande parte da África, a homofobia faz parte do quotidiano: atos homossexuais são criminalizados em cerca de 30 países do continente. As restrições dos direitos LGBTQ na Europa não chegam nem aos pés dos níveis de discriminação e perseguição de Uganda, onde o Estado instila na população queer o medo pelas próprias vidas.

Um recente “projeto de lei anti-homossexualidade” é um dos conjuntos de imposições contra minorias mais rigorosos do mundo, prevendo até mesmo pena de morte para atos homossexuais “com agravantes”. Antes mesmo de sua aprovação, porém, quem é denunciado vai parar imediatamente atrás de grades.

Parte da comunidade LGBTQ do país da África Oriental tem escapado para o Quênia, onde a homossexualidade também a proibida, mas só punível se praticada em público.

Indonésia: Sexo extraconjugal punido com prisão

Na Indonésia, o matrimônio homossexual é ilegal. Porém a criminalização da sexualidade não se restringe à comunidade LGBTQ: o país se impôs a meta de dar fim a toda atividade sexual fora do casamento até o ano 2025. Os infratores estão ameaçados com até um ano de prisão. A regra se aplica não só aos residentes, mas também aos visitantes do exterior, como os turistas da vizinha Bali.

No tocante à homossexualidade, o país está se afastando cada vez mais de sua política passada: apesar de possuir a maior população muçulmana do mundo e ao contrário de numerosas nações islâmicas, por muitos anos a Indonésia fora tolerante com relações entre indivíduos do mesmo sexo.

A província autônoma de Aceh adota há bastante tempo penalidades mais severas, com base numa interpretação da xaria, a lei canônica do Islã, adotada em 2003: esta pune o sexo homossexual com 100 golpes de vara, apedrejamento e açoitamento em público.

Fonte: Deutsche Welle – Imagem: JUSTIN TALLIS/AFP/Getty Images

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