Michelle Bolsonaro entrou no campo de batalha fazendo soar as trombetas.
Ontem, durante um culto religioso em Belo Horizonte, a primeira-dama afirmou em discurso que a cadeira onde se senta o seu marido, o presidente Jair Bolsonaro, pertence ao “presidente maior”.
“É do rei que governa essa nação”, afirmou, referindo-se a Deus. Ela disse ainda que o Palácio do Planalto já foi “consagrado a demônios” e hoje é “consagrado ao Senhor”.
Michelle frequenta a igreja Atitude, que embora seja de denominação batista, incorpora um discurso próximo do neopentecostalismo.
Ao usar o verbo “consagrar”, a primeira-dama se colocou, publicamente, dentro da arena em que, segundo a retórica bolsonarista, o bem e o mal se confrontam — o primeiro representado por Jair Bolsonaro (PL) e o segundo, pelo ex-presidente Lula (PT).
“O neopentencostalismo divide o mundo entre as forças de Deus e do Diabo e, dentro dessa estrutura de pensamento, nós, humanos, podemos “consagrar” espaços”, explica o pastor batista Kenner Terra.
“Ou seja: podemos ‘tornar’ um determinado lugar uma possessão do demônio ou de Deus”. Michelle seria, portanto, uma “agente” dessa consagração.
O uso frequente que a primeira-dama faz do verbo “interceder” tem o mesmo propósito de apresentá-la como alguém capaz de influenciar na transformação da realidade, afirma Terra, também professor de Linguagens da Religião. “A linguagem neopentecostal tem um caráter bélico e a intercessão pela oração, por exemplo, é entendida como uma forma de os fieis fornecerem munição para essa batalha espiritual entre Deus e o Diabo”.
Na semana passada, circulou pela internet um vídeo em que Michelle Bolsonaro guia um grupo de evangélicos para orar no Palácio do Planalto depois do expediente. Nas imagens publicadas, um grupo de fieis desce a rampa dentro do palácio cantando orações religiosas. Michelle chama esse grupo de “meus intercessores”.
“Ela está aderindo à campanha do marido usando uma linguagem que, além de ser muito conhecida dos evangélicos e soar para eles autêntica, é também emotiva e, por isso, poderosa”, afirma o professor e cientista político Vinicius do Valle, diretor do site Observatório Evangélico.
Para o cientista político, no entanto, assim como para o pastor Terra, há que se esperar para medir os reflexos eleitorais da nova postura da primeira-dama entre os evangélicos. “Uma parcela dos cristãos evangélicos tem grande resistência ao envolvimento da igreja com a política”, diz Terra. “E o fato de Michelle ter feito o seu discurso de um púlpito está causando reações negativas”, afirma.
De acordo com o último Datafolha, Jair Bolsonaro tem o apoio de 43% do eleitorado evangélico. Segundo integrantes da sua campanha, no entanto, o percentual de adesão ao presidente entre os fieis pentecostais e neopentecostais chega a 70%, e o objetivo é de que suba até 80%. Os últimos eventos indicam que Michelle tomou para si essa missão.
Fonte: UOL