A eleição de petistas e aliados para os governos do eixo São Paulo-Rio-Minas Gerais ganhou prioridade entre dirigentes do PT nas articulações para a campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A escolha de candidatos e a construção de alianças nesses estados são tratadas como pontos essenciais não apenas para impulsionar Lula, mas também para dar estabilidade a uma possível Presidência petista.
Segundo integrantes do partido, além dos 60 milhões de votos em jogo, esse triângulo pode ter governadores que atuem para conter eventuais abalos a uma gestão do ex-presidente —incluindo o risco de um processo de impeachment.
A ideia é erguer um polo de sustentação política que complemente a força que a legenda tem no Nordeste. Para isso, integrantes da campanha de Lula negociam a formação de chapas competitivas nos três estados.
O quadro é observado com cautela por dirigentes do PT, uma vez que a sigla ainda não bateu o martelo em relação a seus planos em nenhum desses três locais.
Petistas trabalham para aproximar Lula da pré-candidatura de Alexandre Kalil (PSD) em Minas Gerais e acertar uma chapa única de esquerda em São Paulo, preferencialmente liderada por Fernando Haddad (PT).
A situação do Rio se tornou alvo de questionamentos. Lula apoia o nome de Marcelo Freixo (PSB) para governador, mas viu nos últimos dias um estremecimento na relação com o grupo do prefeito carioca, Eduardo Paes (PSD).
“Esses três estados têm uma importância para nós, assim como o Nordeste é importante, tanto para ganhar a eleição como para a governabilidade”, diz a presidente do PT, Gleisi Hoffmann.
Na avaliação de petistas, governadores nesses estados podem ter influência sobre parte das bancadas de deputados e senadores. Essa ascendência pode contribuir para a formação de maiorias parlamentares favoráveis ao governo ou, ao menos, de uma proteção contra investidas de opositores.
Além disso, Rio e São Paulo também têm os maiores orçamentos estaduais e movimentam parte da economia e do turismo. Desta forma, são palcos importantes para o governo federal investir em obras estruturais e ações que sirvam de vitrine para o país.
A insistência do partido na candidatura de Haddad em São Paulo decorre dessa lógica. Dirigentes dizem enxergar uma chance inédita de vitória no estado e avaliam que o nome do ex-prefeito da capital paulista é mais competitivo do que o de potenciais aliados, como Márcio França (PSB).
O ex-presidente aposta que a alta rejeição ao governador João Doria (SP) fragiliza o candidato apoiado pelo tucano, Rodrigo Garcia (PSDB-SP), abrindo espaço para o crescimento de uma candidatura de esquerda.
Segundo a última pesquisa Datafolha, divulgada em dezembro, Doria tem rejeição de 38% dos paulistas e aprovação de 24%.
O petista avalia também, em conversas privadas, que a presença do ex-governador paulista Geraldo Alckmin (sem partido) em sua chapa e o apoio do ex-tucano a Haddad vão impulsionar a candidatura do ex-prefeito de São Paulo.
Lançar uma candidatura única é uma aposta do PT, que teme a fragmentação de votos no estado.
Lula já se reuniu com Guilherme Boulos (PSOL) e diz a aliados que dá como certa a desistência do líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) da disputa. Em outra frente, ex-presidente deverá ter um encontro também com França para tratar do assunto.
Apesar dos números positivos, os petistas consideram que a eleição paulista tende a ser dura, dado o potencial de crescimento do candidato bolsonarista no estado.
No Rio, uma fratura recente pode dificultar os planos do ex-presidente. Ainda que Lula tenha fechado apoio à candidatura de Freixo, petistas demonstraram incômodo com movimentos recentes de Eduardo Paes.
Aliados do ex-presidente gostariam de ter o prefeito carioca no mesmo palanque de Freixo e Lula.
No início de fevereiro, porém, Paes disse ao jornal Valor Econômico que o petista usa “salto alto” ao apoiar o deputado do PSB. Ele defende a candidatura do ex-presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) Felipe Santa Cruz.
Lula se reuniu com o prefeito na terça-feira (15) para discutir a eleição para o governo fluminense. Paes manteve o apoio a Santa Cruz, mas os dois acertaram um acordo para que estejam juntos no segundo turno.
Além de encontrar essa divisão no estado, alguns petistas têm colocado em dúvida as chances de vitória de Freixo caso ele não tenha uma base mais ampla, com a participação do grupo de Paes. Esses aliados de Lula temem que, nesse cenário, o atual governador Cláudio Castro (PL) saia fortalecido.
O ex-presidente, porém, não pretende abrir mão do apoio a Freixo, em quem diz ter muita confiança. Em conversas reservadas, Lula diz que a candidatura do deputado é a única chance que ele tem de estabelecer uma polarização com Castro, segundo indicam pesquisas.
Por esse raciocínio, mesmo que Freixo não vença, o petista terá um palanque forte disposto a defendê-lo em um estado cuja maioria dos eleitores votou em Bolsonaro na última eleição.
Hoje, a única hipótese de o ex-presidente retirar apoio a Freixo é no cenário em que o próprio Paes saia candidato a governador, o que o prefeito já disse que não fará.
Já em Minas Gerais, as conversas avançam em direção ao apoio de Lula à candidatura de Alexandre Kalil. O PT já decidiu que não terá candidato e avalia que o prefeito de Belo Horizonte tem chances de evitar a reeleição do atual governador, Romeu Zema (Novo).
Uma aliança no estado é uma das peças nas negociações nacionais entre PT e PSD.
Embora o presidente do PSD, Gilberto Kassab, mantenha a intenção de lançar um candidato do próprio partido à Presidência, petistas dizem acreditar que o apoio a Kalil poderia abrir caminho para um acordo entre as duas legendas na disputa pelo Planalto.
Lula deve marcar uma viagem a Minas para encontrar aliados. Nessa passagem pelo estado, ele deve procurar Kalil para conversar sobre a aliança.
O ex-presidente tem ciência de que a eleição mineira também não será fácil. Pesquisas indicam Zema à frente de Kalil, que aparece em segundo lugar na corrida pelo governo mineiro. Petistas creem, porém, que com apoio de Lula, o atual prefeito se torna mais competitivo.
Em 2018, os três estados elegeram governadores alinhados a Jair Bolsonaro: João Doria (PSDB) em São Paulo, Wilson Witzel (PSC) no Rio e Zema em Minas.
No segundo turno daquela eleição, Bolsonaro teve uma vantagem de 12,8 milhões de votos sobre Fernando Haddad nesses estados —o que anulou a vantagem de 11,5 milhões de votos que o petista teve no Nordeste e ajudou a consolidar a vitória do atual presidente.
Embora os petistas descrevam os governadores desses estados como uma espécie de tropa de choque contra um possível impeachment, eles não são uma garantia de estabilidade de um presidente.
Quando Dilma Rousseff (PT) foi afastada da Presidência, em 2016, os governadores de São Paulo, Rio e Minas eram Geraldo Alckmin (PSDB), Luiz Fernando Pezão (MDB) e Fernando Pimentel (PT), respectivamente. O primeiro aderiu à tese do impeachment tardiamente, e os outros dois eram aliados de Dilma.
Fonte: Folha de São Paulo