O ministro-chefe da Casa Civil de Bolsonaro, senador licenciado Ciro Nogueira, do Progressistas, que é investigado em denúncia da Procuradoria Geral da República acusado dos crimes de corrupção ativa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro no inquérito n° 4407, pode ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal. Na denúncia, protocolada em 10 de fevereiro de 2020, a subprocuradora-Geral da República, Lindôra Maria Araújo, pede a condenação de Ciro Nogueira 14 vezes pelo crime de corrupção passiva, além do ressarcimento de R$ 7,3 milhões aos cofres públicos.
O ministro Edson Fachin, do STF, determinou, em 28 de setembro deste ano, que o inquérito fosse incluído na pauta para ser julgado nas próximas sessões do STF.
Os ministros do Supremo vão decidir se recebem a denúncia da Procuradoria-Geral da República e tornam réus o senador licenciado Ciro Nogueira, o ex-assessor Lourival Nery Júnior e os delatores Claudio de Melo Filho, Benedicto Barbosa da Silva Júnior, Fernando Migliaccio da Silva Jose de Carvalho Filho e Marcelo Odebrecht.
No inquérito, aberto com base em delação premiada, executivos da Odebrecht revelaram terem sido procurados pelo senador piauiense com a proposta para que a empresa repassasse dinheiro a ele em troca de apoio no Senado Federal para a aprovação de matérias como a Medida Provisória 613, que criava mecanismos para facilitar as operações da indústria química brasileira, com a redução da carga fiscal, concessão de incentivos fiscais à produção de etanol e à indústria química por meio de crédito presumido e redução de alíquota do PIS/Pasep e da Cofins.
O esquema – A Polícia Federal investigou como funcionava o esquema: políticos cobravam valores aos empresários da Odebrecht, que eram avaliados pelas instâncias superiores do grupo empresarial. Após o aprovo dos altos escalões da Odebrecht, os valores eram liberados, com base principalmente na importância do parlamentar no cenário político brasileiro e de como ele poderia atuar no Congresso para que a empresa tivesse acesso a essas “facilidades”.
Aprovada a propina pelos executivos, os valores eram levados ao Setor de Operações Estruturadas (S.O.E.) e registrada em um sistema secreto de contabilidade, onde cada político recebia um codinome. “Cerrado”, “Pequi” e o “Helicóptero”, eram os apelidos do senador Ciro Nogueira, beneficiado com R$ 1,6 milhão no esquema, segundo a delação do lobista da Odebrecht, Claudio Melo Filho. O delator também diz que em 2010 foram destinados R$ 100 mil para Paes Landim com o codinome “Decrépito”, R$ 200 mil para Heráclito Fortes com o codinome “Boca Mole”.
Por último, os valores iam sendo liberados. No caso das entregas feitas em território nacional, era obedecido um esquema, que se iniciava com a S.O.E. definindo valores, a data, local e senha para a entrega. Logo depois um executivo da Odebrech repassava essas informações ao político ou a um intermediário. Então por último acontecia a entrega, onde no local e horário agendado, duas pessoas se encontravam, onde um dizia a senha e o outro fazia a entrega dos valores em espécie.
“Havia rígida fragmentação – e compartimentação – das rotinas e dos dados manipulados em cada etapa do processo de corrupção. O sistema era construído de forma que os participantes da primeira fase (empresários e agentes políticos que ofereciam e solicitavam vantagem econômica indevida) não tivessem conhecimento de quem ou como ocorreria a efetiva entrega de valores”, destacou relatório da PF.
O transporte e a entrega de dinheiro oriundo do esquema de propinas da Odebrecht eram executados por funcionários da empresa de transporte de valores Transnacional.
Ciro Nogueira era “Piqui”
De acordo inquérito da PF, elaborado pelo delegado da Polícia Federal, Albert Paulo Sérvio de Moura, funcionários da empresa Transnacional confirmaram que “efetuaram repetidas entregas de dinheiro na cidade de São Paulo, em apartamento alugado por Lourival Ferreira Nery Júnior, assessor do senador Ciro Nogueira. O endereço do imóvel e o nome do recebedor constam em diversas planilhas da Odebrecht”.
Segundo o delegado Albert, as entregas foram confirmadas por funcionários da empresa Transnacional que reconheceram Lourival Nery como o recebedor do dinheiro. Além disso, em algumas conversas no Skype constam informações sobre onze entregas realizadas no endereço do então assessor de Ciro Nogueira na cidade de São Paulo.
O inquérito aponta que em quatro meses, de setembro de 2014 a janeiro de 2015, em São Paulo, o “senador Ciro Nogueira Lima Filho, por intermédio de seu assessor Lourival Ferreira Nery Júnior, recebeu da Odebrecht R$ 7.300.000,00 milhões em espécie, sem registros ou contabilidade regular, para, em contrapartida, atuar no Congresso Nacional em favor pautas legislativas de interesse do grupo empresarial, com destaque para a Medida Provisória 613 (Regime Especial da Indústria Química)”.
Os empresários Marcelo Bahia Odebrecht e Cláudio Melo Filho foram os que atuaram diretamente com o senador Ciro Nogueira, em relação a negociação dos valores, segundo o relatório da PF.
O delegado Albert afirmou que são extensas as provas contra o senador. “Muito além dos depoimentos e planilhas trazidos pelos empresários, existe todo um acervo documental obtido a partir de fontes externas ao grupo Odebrecht (reconhecimentos, depoimentos, e-mails e arquivos digitais) que leva à conclusão de que Ciro Nogueira, no exercício e em razão da função de senador da República, recebeu e transportou clandestinamente dinheiro de corrupção… Em todos estes documentos, há convergência de locais, datas, valores e circunstância que permitem concluir, além de qualquer dúvida razoável, que o senador Ciro Nogueira, em comunhão de desígnios com empresários, doleiros e assessores, praticou crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa”.
A denúncia da PGR
A Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou o senador Ciro Nogueira (Progressista/PI) pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Além dele, outras seis pessoas, incluindo o empresário Marcelo Odebrecht, também foram denunciadas. Apresentada no âmbito da Operação Lava Jato, a ação é resultado de uma das frentes de investigação instauradas em decorrência de declarações fornecidas pelo empresário e por diretores da Construtora Odebrecht como parte do acordo de colaboração premiada firmado com o Ministério Público Federal (MPF), em 2016. As provas reunidas nessa apuração apontam que o senador recebeu do grupo empresarial R$ 7,3 milhões em vantagens indevidas.
A inicial da ação penal detalha o funcionamento do esquema criminoso que beneficiou o senador que, desde 2013, preside o Progressistas, antigo Partido Progressista (PP). Os investigadores reuniram provas de que as doações eleitorais da Odecrecht à legenda saltaram 512,5% em quatro anos. O valor global de doações da empresa ao partido foi de R$ 720 mil em 2010, passou para R$ 2,6 milhões em 2012, e alcançou R$ 4,4 milhões em 2014. Considerando apenas o total de doações, o número saltou de 6 para 42. O período coincide com o momento em que Ciro Nogueira tornou-se uma das mais importantes lideranças do partido, e a Petrobras firmou “relevantes contratos” em benefício do grupo econômico.
O valor – Tanto doações legais quanto não contabilizadas seriam parte do esquema criminoso que desviou recursos da empresa pública, e que contou com a participação direta de empresários, políticos de vários partidos, entre os quais o PP, operadores financeiros e agentes públicos. No caso dos partidos, a quem cabia indicar diretores de áreas estratégicas da companhia, a contrapartida era dar sustentação política ao governo federal e defender os interesses dos empresários financiadores do esquema.
A relação entre o PP e a construtora é objeto do inquérito 3.989, cuja ação penal por organização criminosa já foi recebida pelo Supremo Tribunal Federal (STF). No caso da petição encaminhada à Suprema Corte, nesta segunda-feira (10), o objetivo é garantir a responsabilização individualizada dos envolvidos que, conforme descreve a coordenadora do Grupo de Trabalho da Lava Jato na PGR, subprocuradora-geral da República Lindôra Maria Araújo, cometeram os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
A petição lembra que, para esconder o esquema criminoso, os envolvidos valeram-se de “um sofisticado esquema de contabilidade paralela, ocultaram a origem, propriedade, localização e movimentação de recursos de origem ilícita”. O parlamentar e o assessor eram identificados por codinomes, assim como os doleiros encarregados de viabilizar os repasses financeiros. Na planilha Drousys, foram feitos 12 registros no valor de R$ 500 mil, cada, em nome de “Piqui”, e dois em nome de “Cerrado”, sendo um de R$ 500 mil, e outro, de R$ 800 mil.
Em relação a Ciro Nogueira, as provas reunidas revelaram o recebimento de propina de forma parcelada, entre 2014 e 2015, em Brasília e em São Paulo. Foram mapeadas 14 entregas de valores, sendo duas diretamente ao parlamentar, e outras 12 por intermédio de Lourival Ferreira Nery Júnior, assessor do partido. Lourival também foi denunciado. Dos R$ 7,3 milhões pagos pela construtora a Ciro Nogueira, R$ 6 milhões foram distribuídos por intermédio do assessor. Os investigadores recolheram provas como comprovantes de viagens feitas por ele para receber e entregar a propina ao senador.
Além das declarações dos colaboradores, a denúncia apresenta provas como diálogos do aplicativo Skype entre empregados de transportadora de valores que coincidem com as datas dos pagamentos e dos comprovantes das entregas de dinheiro. Também integram o conjunto probatório a análise de e-mails e outros documentos apreendidos por ordem judicial, além de registos de visitas de executivos da Odebrecht ao Senado Federal e planilhas da empresa, dos doleiros e da transportadora com as mesmas informações.
Todas as evidências foram corroboradas por depoimentos de colaboradores como Marcelo Odebrecht e Cláudio Melo Filho, então vice-presidente de Relações Institucionais do grupo, e principal interlocutor com o senador. Além de Marcelo e Cláudio, foram denunciados outros três diretores da empresa: José de Carvalho Filho, Fernando Migliaccio da Silva e Benedicto Barbosa da Silva Júnior.
Pedidos – Na ação, o MPF requer que Ciro Nogueira e Lourival Ferreira sejam condenados com base na participação individual no esquema criminoso, façam o ressarcimento aos cofres públicos dos danos materiais provocados, e também que sejam obrigados a pagar indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 7,3 milhões e R$ 6 milhões, respectivamente. Além disso, foi requerida a perda da função pública. Em relação aos cinco colaboradores denunciados, o MPF pede que sejam observados os termos de cada acordo de colaboração premiada.
O outro lado – Os advogados do ministro Ciro Nogueira pedem a rejeição da denuncia, sob o argumento que as acusações se baseiam somente nas palavras dos delatores e nas planilhas apresentadas.
A defesa alega que o próprio STF reconheceu a imprestabilidade das provas produzidas unilateralmente. No caso da delação da Odebrecht a perícia da PF constatou que o banco de dados com as tabelas de valores, datas de pagamento e apelidos de quem teria recebido propinas da empreiteira foi alterado.