Em cerca de dois meses, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (sem partido, ex-PSDB) passou de favorito na eleição para o Palácio dos Bandeirantes, com um arco de alianças fechado, para ser o nome a ocupar a posição de vice na chapa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na disputa pelo Planalto. Segundo interlocutores do ex-governador, hoje, Alckmin já está 100% certo sobre formalizar a parceria com Lula.
Nesse processo, o ex-tucano perdeu o espaço que teria na sua provável nova casa, o PSD, do ex-prefeito paulistano e ex-ministro Gilberto Kassab —que, agora, já sonda uma nova candidatura ao governo paulista. No PSB, a reclamação é que Alckmin recebeu a ficha de filiação em 13 de dezembro e, até agora, não deu uma resposta, o que abriu espaço para sondagens do Solidariedade e do PV.
“Tudo indica que ingressará [no PSB], mas estamos aguardando que ele tome sua decisão”, disse o presidente do partido, Carlos Siqueira, na quinta-feira (20) a jornalistas em Brasília. “Ele é experiente. Saberá escolher seu partido. E sabe qual é o objetivo dessa escolha. Estamos aguardando.”
Na base de sustentação do ex-governador em São Paulo, o deputado estadual Campos Machado (Avante) teve de mudar o rumo e reclama de deslealdade por parte de Alckmin.
Seu partido já estava com a estratégia em andamento em torno da possível candidatura do ex-tucano ao governo paulista, em oposição ao PSDB. Agora, toda a estrutura que preparou para apoiar Alckmin pelo estado foi direcionada para o pré-candidato tucano, o vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB).
Mudança de rumo
Em novembro, Alckmin havia avisado a seus interlocutores que teria 90% de chance de ser candidato ao governo de São Paulo e 10%, a vice na chapa de Lula —na qual embarcaria para marcar oposição a Jair Bolsonaro (PL) e se o petista se mostrasse como a opção mais viável para isso, o que as pesquisas têm apontado hoje.
No começo deste ano, após encontros e aparições públicas do petista com o ex-tucano, a situação se inverteu, e passou a ser de 90% para a possibilidade de vice, e 10% para a de governador. Nos últimos dias, porém, ele avisou a pessoas próximas: agora é 100% para vice. Resta definir o partido, ponto que tem gerado problemas para além da chapa.
Situação no PSB
O PSB aparece como a opção favorita para Alckmin e para o PT por causa de seu tamanho, o maior entre os aliados da candidatura de Lula.
O partido já tem praticamente certa a decisão de que irá apoiar Lula na disputa presidencial porque o objetivo do PSB é que Bolsonaro seja derrotado. O petista seria a maior possibilidade para esse cenário, na avaliação deles.
Mas, ao longo do tempo, surgiu a pressão, externa e interna, para que o PSB fizesse federação com PT, PCdoB e PV, e também filiasse Alckmin. Mas, para o partido, essas questões não seriam “cavalo de batalha”, segundo uma fonte, que diz que a direção avalia que a federação, hoje, traria mais problemas do que benefícios.
A prioridade do partido é encabeçar as disputas estaduais em São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Acre e Pernambuco.
O principal dos problemas já está na mesa: a candidatura ao governo de São Paulo. Se houver federação com o PT, será preciso optar entre Márcio França (PSB) e Fernando Haddad (PT). Nenhum dos dois abre mão da pré-candidatura.
Para 2024, o desejo do PSB é ter a deputada federal Tabata Amaral como candidata à Prefeitura de São Paulo, outra posição que o PT nunca deixou de disputar —o que gerou problemas já em 2020 com a presença de Guilherme Boulos (PSOL), mais competitivo, no pleito.
Na equipe de França, o argumento hoje traz que não é ideal abrir mão de pleitear o governo porque ele teria chances de vitória até em um segundo turno. Em uma disputa ao Senado, que hoje está completamente aberta, sem nomes colocados, é apenas um turno de votação, com riscos maiores.
Para tentar salvar a federação, PT, PSB, PV e PCdoB vão solicitar um prazo maior ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Hoje, os partidos têm até 1º de março para protocolar o pedido de criação.
Na manhã de sexta (21), os partidos discutiam pedir três meses a mais, com o prazo sendo encerrado em 31 de maio, o que daria uma chance para essa federação sair do papel com essa composição. O pedido ainda não foi formalizado porque eles devem aguardar uma avaliação do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre o tema em 2 de fevereiro.
PSD: desejo do PT
Kassab, a todo instante, reforça que não deixará de ter uma candidatura própria ao Planalto —que hoje seria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG). E também já anunciou que não haverá espaço para Alckmin ser vice de Lula como filiado ao PSD.
Mas o petista, em declaração na última quarta (19), disse que tem “conversado muito com o PSD” em relação a projetos de mudanças no país. “Tenho conversado com o Kassab. É bem possível que a gente possa construir alguma coisa junto.”
Pensando em candidaturas, Lula reforçou que “tem uma boa relação com o Kassab, com muita gente do Kassab. Sabe? Vou conversar. Você sabe que, em política, conversa é [algo] bom. E você sabe que, de uma boa conversa, sempre sai uma coisa boa.” Presidente do PT, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR) disse, no dia seguinte, que gostaria de ter Kassab como aliado.
Machado com nova aliança
Um dos políticos mais incomodados com a aproximação entre Lula e Alckmin é o deputado estadual Campos Machado (Avante-SP), tido como um dos maiores defensores das gestões do ex-tucano na Assembleia Legislativa de São Paulo.
Machado não quis conceder entrevista ao UOL, mas, em conversa com o Diário do Grande ABC, recordou que a candidatura de Alckmin para o Palácio dos Bandeirantes estava certa até meados de dezembro do ano passado, quando o ex-tucano disse que não tinha mais vontade de ser governador, cargo que exerceu por quatro mandatos e que queria promover uma união nacional.
Agora, o deputado trabalha pela candidatura de Garcia. “Os votos que seriam trabalhados para o Geraldo iremos trazer para o Rodrigo”, disse ao jornal. “Grande parte dos alckmistas não aceita o acordo que foi feito com o Lula.”
Machado descartou votar na chapa Lula-Alckmin para presidente, falando que o ex-governador não foi leal. “O Geraldo é um homem de bem, mas deveria ter falado para mim. Ele tem o direito de escolher o caminho que quiser. Mas não é o mesmo que o meu.”
Também aliado de Alckmin, o presidente do PV, José Luiz Penna, disse acreditar que o ex-governador “foi contaminado por uma coisa maior”. “Ele sabe o sinal positivo que é aceitar esse caminho com o Lula. E o próprio Lula também sabe que ele sinalizou uma ideia de frente democrática muito positiva.”
Sobre a possibilidade Alckmin não ser vice de Lula, Penna disse ao UOL que nem supõe “um negócio desse”. “Seria um desarranjo total”, disse o presidente do PV, que também tenta filiar Alckmin.
Fonte: UOL