Papa pede perdão por repressão da Igreja a povos indígenas do Canadá
O papa Francisco voltou a classificar sua viagem ao Canadá como uma “peregrinação penitencial” e pediu perdão por todo sofrimento provocado pela Igreja Católica contra os povos indígenas em diversas regiões do país até meados dos anos 1970.
“Vim à sua terra natal para lhes contar pessoalmente a minha dor, implorar o perdão, a cura e a reconciliação de Deus, para expressar a minha proximidade e rezar com vocês e por vocês”, disse o Papa ao iniciar o seu discurso para as comunidades nativas do Canadá em Maskwacis.
O Pontífice, que tenta reconstruir a relação com as comunidades indígenas que foram vítimas de maus-tratos da Igreja Católica em campanhas de assimilação, expressou “indignação e vergonha” e fez um apelo para que “os sofrimentos do passado deem lugar a um futuro de justiça, cura e reconciliação”.
De acordo com o Papa, “a memória daquelas crianças nos entristece e nos impele a agir para que cada criança seja tratada com amor, honra e respeito”.
“Eu humildemente peço perdão pelo mal que muitos cristãos cometeram contra os povos indígenas”, enfatizou. “Peço perdão em particular pela maneira como muitos membros da Igreja e comunidades religiosas têm cooperado também com indiferença a esses projetos de destruição cultural e assimilação forçada pelos governos da época que culminou no sistema de ensino residencial”.
O líder da Igreja Católica lembrou que “quando os colonos europeus ali chegaram pela primeira vez, houve a grande oportunidade de desenvolver um encontro fecundo entre culturas, tradições e espiritualidade”.
Mas, de acordo com Francisco, “as políticas de assimilação acabaram marginalizando sistematicamente os povos indígenas; de modo que, mesmo através do sistema de ensino residencial, suas línguas e culturas foram depreciadas e reprimidas; as crianças sofreram abusos físicos e verbais, psicológicos e espirituais”, além de terem sido retiradas de suas casas quando eram pequenas”, marcando indelevelmente a relação entre pais e filhos, avós e netos.
O duro discurso é feito na esteira da descoberta de valas comuns com centenas de corpos não identificados em antigos internatos administrados pela Igreja Católica no Canadá.
As primeiras covas foram encontradas em maio de 2021, no terreno de uma antiga escola de Kamloops, na província ocidental da Colúmbia Britânica, expondo as feridas nunca curadas da cristianização forçada de indígenas canadenses.
“O lugar em que nos encontramos faz ressoar em mim um grito de dor, um grito abafado que me acompanhou nestes meses. Recordo o drama sofrido por tantos de vocês, suas famílias, suas comunidades nas escolas residenciais”, disse ele.
Jorge Bergoglio explicou que esses “são traumas que, de certa forma, revivem cada vez que são lembrados” e percebe que até o encontro de hoje “pode despertar lembranças e feridas”.
No entanto, “é bom lembrar, porque o esquecimento leva à indiferença e, como já foi dito, ‘o oposto do amor não é o ódio, é a indiferença… o contrário da vida não é a morte, mas a ‘indiferença à vida ou à morte'”, acrescentou.
Segundo o Pontífice, “recordar as experiências devastadoras que ocorreram nos internatos afeta, indigna, dói, mas é necessário”, principalmente porque “tem sido devastador para o povo destas terras”.
Para ele, “as consequências globais das políticas ligadas às escolas residenciais foram catastróficas”. “O que a fé cristã nos diz é que foi um erro devastador, incompatível com o Evangelho de Jesus Cristo”, admitiu.
“É doloroso saber que essa base compacta de valores, língua e cultura, que deu a seus povos um genuíno senso de identidade, foi corroída e você continua pagando os efeitos”, ressaltou.
O Santo Padre enfatizou que “diante deste mal indignado, a Igreja se ajoelha diante de Deus e pede perdão pelos pecados de seus filhos”, mas explicou aos nativos do Canadá que suas “desculpas não são o ponto de chegada, mas o primeiro passo”.
“Muitos de vocês e seus representantes afirmaram que as desculpas não são um ponto de chegada. Concordo plenamente, são apenas o primeiro passo, o ponto de partida”, afirmou.
O Papa explicou que uma parte importante deste processo é realizar uma busca séria da verdade sobre o passado e ajudar os sobreviventes dos internatos a empreender caminhos de cura dos traumas sofridos. Além disso, garantiu que continuará a encorajar o compromisso de todos os católicos com os povos indígenas.
Antes da cerimônia principal, o papa Francisco visitou – usando sua cadeira de rodas – o cemitério dos povos nativos , localizado a alguns metros da ex-escola para indígenas Ermineskin. No local, o líder católico fez uma oração silenciosa por alguns minutos e se dirigiu para o Maskwacis Park.
A área de Maskwacis, chamada de 1891 a 2013 de Hobbema, está em Alberta. Ela sedia as reservas do grupo das Tribos Indígenas do Canadá Ocidental, as Quatro Nações de Maskwacis: Ermineskin, Louis Bull, Montana First Nation e Samson.
As Primeiras Nações são aquelas que assinaram o Tratado 6, um dos 11 assinados pelos povos indígenas – Firsts Nations – e da Coroa Canadense entre 1871 e 1921.
Fonte: Ansa