Família de brasileiro morto na Ucrânia aguarda Itamaraty para retirar corpo
A família do combatente brasileiro André Hack, 43, aliado das tropas ucranianas que morreu há uma semana em combate contra a Rússia, diz que até agora não foi procurada pelo Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores) para agilizar o transporte dos restos mortais dele para o Brasil.
Mesmo após os relatos de combatentes que informaram ter retirado o corpo do voluntário do campo de batalha, o governo federal levou quatro dias para confirmar oficialmente o óbito do primeiro brasileiro morto em combate na guerra da Ucrânia. A missa de sétimo dia ocorreu neste sábado (11) na Paróquia Nossa Senhora Medianeira, em Porto Alegre, onde André nasceu.
Procurado pelo UOL, o Itamaraty não se manifestou. A pasta só se posicionou em nota divulgada na quinta-feira (9) para confirmar a morte de André, garantindo que daria suporte ao caso —situação que não se confirmou, segundo a família.
“[O Itamaraty] mantém contato com familiares para prestar-lhes toda a assistência cabível, em conformidade com os tratados internacionais vigentes e com a legislação local”, dizia nota da pasta.
Contudo, a família nega que o órgão tenha prestado qualquer tipo de apoio. “Não fomos procurados. Vamos ter que correr atrás”, disse Letícia Hack, irmã de André.
Ela encaminhou à reportagem um áudio atribuído a um funcionário da Embaixada do Brasil na Ucrânia, com quem mantém contato. “O diálogo com vocês será feito lá por Brasília, na divisão de assistência consular [do Itamaraty]”, disse a pessoa.
O combatente brasileiro morto na Ucrânia deixou cinco filhos. A família mora em Porto Alegre, mas disse que os restos mortais devem ser levados para o Ceará, onde mora a companheira de André, mãe da filha caçula dele de 3 anos.
Arrastado por colega para fora da zona de conflito
Após morrer ao ser atingido por disparos, o corpo de André foi arrastado por um colega para que fosse retirado da zona de conflito e está em um necrotério na região, segundo a mensagem em áudio atribuída ao comandante da unidade.
“[Eu falei com o] rapaz que puxou ele para um ponto de evacuação, já falecido. A notícia que a gente tem é que o corpo está no necrotério pela região. Todas as minhas condolências para a família. Nós estamos abalados, porque a situação foi muito trágica”, disse no áudio o homem que se identificou como comandante da unidade de André.
André carregava cicatrizes de conflitos anteriores quando atuava pela legião estrangeira francesa. Há seis anos, só escapou da morte em uma missão na Costa do Marfim, na África, porque estava com colete à prova de balas quando foi atingido por quatro tiros no peito —a área em que ele estava havia sido alvo de bombardeios e mísseis, segundo a família.
Resgatado às pressas de helicóptero, precisou ficar dois meses hospitalizado para se recuperar de um traumatismo craniano e de fraturas na mandíbula e tórax. Mas isso não o impediu de se alistar junto às tropas ucranianas há três meses.
Ex-militar e socorrista: ‘ele queria ajudar’
Ex-militar do Exército, trabalhou como técnico em Enfermagem e teve uma rápida passagem pela Islândia e se mudou para Quixadá (CE) em 2014, a 170 km da capital Fortaleza. No ano seguinte, se alistou junto à legião estrangeira francesa e começou a participar de missões em países em conflito.
Nem mesmo os graves ferimentos sofridos em 2016 na Costa do Marfim fizeram com que ele desistisse da carreira militar. Depois disso, retornou ao Ceará, onde se formou em Enfermagem em 2021. E teve uma passagem temporária por Portugal —foi quando começou a guerra na Ucrânia e André decidiu se apresentar como voluntário das tropas ucranianas.
“Ele queria ajudar”, disse a irmã Letícia Hack.
‘Perdi amigos lá’, disse André após ataque russo
Há mais de três meses na zona de confronto, André fazia parte do primeiro grupo de voluntários brasileiros que se alistou junto às tropas do país invadido. “A gente veio pra ajudar”, disseram os integrantes do grupo.
Em entrevista ao UOL à época, André relatou ter deixado a área militar atacada pelos russos na região de Lviv horas antes de um bombardeio que deixou ao menos 35 mortos na madrugada de 13 de março, segundo o governo ucraniano. “Perdi amigos lá”, disse.
Brasileiro na guerra
Os brasileiros ganharam notoriedade por compartilhar a rotina deles no campo de batalha, com registro até de um vídeo de confronto próximo à capital Kiev.
Em uma série de gravações, é possível ouvir o som de tiros, bombas e rajadas, enquanto as imagens mostram o grupo se posicionando atrás de árvores e na grama.
Em um dos registros, que foi deletado, um deles diz: “se juntem a nós, seus covardes”, em resposta a críticas de internautas por compartilharem imagens da guerra nas redes sociais.
Os brasileiros também gravaram o momento em que chegaram à capital Kiev, em meados de março. Em vídeo postado nos stories André registrou o próprio fuzil dentro de um veículo com a localização em Kiev. Em seguida, captou imagens suas em uma área residencial da cidade.
Fonte: UOL