O Congresso Nacional derrubou, nesta quinta-feira (14), os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao projeto de lei que estabelece a tese do marco temporal das terras indígenas. A tese diz que os indígenas só terão direito ao território em que estavam na promulgação da Constituição, em outubro de 1988. Em sessão conjunta, 53 senadores e 321 deputados apoiaram a derrubada dos vetos, enquanto 19 senadores e 137 deputados votaram para manter a decisão presidencial. Houve ainda uma abstenção entre os deputados, nenhuma entre senadores.
Em 21 de setembro deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a tese era inconstitucional. Oito dias depois, a Câmara e o Senado aprovaram um projeto de lei para incluir a tese do marco temporal em lei federal. Em outubro, o presidente Lula vetou parcialmente o projeto aprovado no Poder Legislativo, argumentando que a tese já havia sido considerada inconstitucional.
Para o senador Luis Carlos Heinze (PP-RS), o veto prejudica a exploração econômica dos territórios do Brasil. “Nenhum país do mundo tem a extensão territorial destinada aos indígenas como nós temos no Brasil. De 114 milhões de hectares de terra para reservas indígenas é muito alto, e querem chegar a 120 e 130 milhões de hectares. O Brasil já está engessado com reservas indígenas, parques nacionais e áreas de preservação.”
Segundo a Fundação Nacional do Povos Indígenas (Funais), as 736 terras indígenas registradas representam 13% do território brasileiro, o que totaliza aproximadamente 117 milhões de hectares. De acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem quase 900 mil indígenas, distribuídos em 305 etnias.
Favorável à manutenção do veto, o deputado federal Tarcísio Motta (PSOL-RJ) argumentou que a Constituição não estabeleceu esta lógica de um marco a partir do qual as ocupações das terras indígenas seriam legítimas.
“Essa é uma batalha de setores do agronegócio interessados em seguir avançando sobre as terras indígenas, e povos e populações indígenas, movimentos sociais, que lutam pela sua sobrevivência, pelo direito de existir”, afirmou.
“A opinião dada pelo governo e a decisão do presidente Lula foi seguindo não só a conversa com a sociedade, mas seguindo o respeito aos povos originários. Essa matéria agride direitos, bota em risco a vida, a educação e o direito ao território. Esses povos estavam aqui muito antes de todos os colonizadores chegarem, e nós não podemos decidir um marco temporal a partir de uma data estabelecida de promulgação da Constituição, que vamos retirar povos que, naquele momento, estava em litígio e tinham direito à terra”, afirmou a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ).
A retomada do marco temporal na legislação deve acionar novamente a manifestação do STF, que considerou a tese inconstitucional.
A derrubada do veto ao marco temporal foi a segunda derrota importante do governo nesta quinta. Mais cedo, senadores e deputados derrubaram outro veto presidencial, desta vez ao projeto que prorroga a desoneração da folha de pagamento de 17 setores econômicos e de pequenos municípios até 2027. A medida era considerada essencial pela equipe econômica para manter o equilíbrio fiscal da União.
Governo sofre revés também na desoneração da folha
Em sessão conjunta do Congresso Nacional nesta quinta-feira (14), senadores e deputados federais derrubaram o veto presidencial ao projeto que prorroga a desoneração da folha de pagamento de 17 setores econômicos e de pequenos municípios até 2027. No Senado, foram 60 votos pela derrubada do veto contra 13 contrários. Na Câmara, foram 378 votos pela derrubada do veto e 78 pela manutenção do veto presidencial.
Ao vetar a medida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva argumentou que a desoneração reduz a contribuição para a Previdência Social, sendo inconstitucional por não demonstrar o impacto financeiro orçamentário, nem indicar a compensação dessas perdas. Implementada em 2011 como medida temporária, a política de desoneração da folha vem sendo prorrogada desde então.
O Ministério da Fazenda vinha defendendo que a desoneração fosse discutida junto com a reforma tributária sobre a renda, a ser discutida em 2024. O governo também prometeu apresentar uma proposta alternativa à desoneração.
A derrubada do veto foi defendida pelo presidente do Congresso Nacional, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que afirmou que a medida pode evitar a demissão dentro dos setores beneficiados. Além disso, ele defendeu que as alternativas à desoneração devem ser apresentadas com a medida em vigor.
“Que os eventuais aprimoramentos a respeito desse tema se deem com a desoneração mantida para que haja previsibilidade. Há 17 setores que se programaram”, justificou.
O deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ) criticou a derrubada do veto. Para ele, o Congresso poderia discutir uma alternativa à desoneração. “Pautar a desoneração no dia de hoje desse jeito é uma provocação ao governo. É querer impor uma derrota ao governo. Não tinha necessidade. O Ministro Haddad queria negociar uma transição [à desoneração]”, lamentou.
Entenda
Aprovado pelo Congresso em outubro, o projeto prorroga até 2027 a contribuição para a Previdência Social de setores intensivos em mão de obra entre 1% e 4,5% sobre a receita bruta. Até 2011, esses setores contribuíam com 20% da folha de pagamento para a Previdência Social.
Os 17 setores beneficiados com a desoneração da folha são confecção e vestuário; calçados; construção civil; call center; comunicação; empresas de construção e obras de infraestrutura; couro; fabricação de veículos e carroçarias; máquinas e equipamentos; proteína animal; têxtil; tecnologia da informação (TI); tecnologia de comunicação (TIC); projeto de circuitos integrados; transporte metroferroviário de passageiros; transporte rodoviário coletivo; e transporte rodoviário de cargas.
Fonte: Agência Brasil – Imagem: Lula Marques