Em um discurso com mentiras e dados imprecisos, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou hoje, na Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), que o Brasil é vítima de “uma das mais brutais campanhas de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal”.
No discurso de abertura do evento, que durou 14 minutos, realizado neste ano por videoconferência em razão da pandemia do coronavírus, Bolsonaro declarou ainda que há uma “campanha escorada em interesses escusos” por parte de “instituições internacionais” junto a “associações brasileiras, aproveitadoras e impatrióticas”. O objetivo, segundo ele, é prejudicar o seu governo.
“Somos vítimas de uma das mais brutais campanhas de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal. A Amazônia brasileira é sabidamente riquíssima. Isso explica o apoio de instituições internacionais a essa campanha escorada em interesses escusos que se unem a associações brasileiras, aproveitadoras e impatrióticas, com o objetivo de prejudicar o governo e o próprio Brasil.”
Bolsonaro, porém, não citou diretamente o nome de nenhuma organização nem de países que estariam por trás dessa articulação, mas buscou reforçar a narrativa de seu governo de que a Amazônia seria alvo de cobiça internacional.
Bolsonaro repete estratégia
A estratégia tem sido adotada pelo Palácio do Planalto na tentativa de rechaçar as críticas à gestão ambiental em decorrência do desmatamento na Amazônia e das queimadas que estão devastando o Pantanal.
Dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente, que coordena o Sistema de Alerta de Desmatamento do Imazon, mostram que o desmatamento na Amazônia subiu 68% em agosto de 2020, na comparação com o mesmo período do ano passado.
O Pantanal, por sua vez, bateu recorde histórico de queimadas para todo o mês de setembro ainda na primeira quinzena. Foram mais de 5.600 focos de incêndio, número quase três vezes acima da média para o mês.
É a segunda vez que o presidente brasileiro discursa em uma Assembleia Geral da ONU sob forte pressão internacional por causa do avanço do desmatamento e de questões ambientais. No ano passado, Bolsonaro classificou como “falácia” a ideia de que a floresta é um patrimônio da humanidade.
Sem evidências, Bolsonaro culpa caboclo e índio
Hoje, o presidente brasileiro disse, sem entrar em detalhes técnicos, que os incêndios na Amazônia ocorrem “praticamente nos mesmos lugares” e atribuiu parte dessa responsabilidade ao “caboclo e o índio”, que teria por hábito queimar “seus roçados em busca de sobrevivência”.
Nossa floresta é úmida e não permite a propagação do fogo em seu interior. Os incêndios acontecem praticamente, nos mesmos lugares, no entorno leste da floresta, onde o caboclo e o índio queimam seus roçados em busca de sua sobrevivência, em áreas já desmatadas.
Ao contrário do que disse o presidente, não há provas de que os incêndios na Amazônia tenham acontecido por iniciativa de caboclos e indígenas. A declaração do presidente, por tanto, é falsa.
Em setembro deste ano, pesquisadores do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e da Universidade de Estocolmo publicaram uma carta na revista Science em que afirmam que boa parte das queimadas e do desmatamento na Amazônia, entre 2019 e 2020, está relacionada a “apropriação e desmatamento em larga escala” realizadas por médios e grandes fazendeiros.
Desmonte da política ambiental
Na ONU, o presidente disse ainda que sua política é de “tolerância zero” com o crime ambiental e que os focos criminosos são combatidos com rigor.
Os focos criminosos são combatidos com rigor e determinação. Mantenho minha política de tolerância zero com o crime ambiental. Juntamente com o Congresso Nacional, buscamos a regularização fundiária, visando identificar os autores desses crimes.”
Ao contrário do que disse o presidente, em seu governo houve desmonte da política ambiental e de órgãos que tradicionalmente atuam na fiscalização de crimes ambientais, como o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
Apesar do aumento no desmatamento no país, as sanções impostas pelo Ibama caíram 60% em um ano.
Além disso, segundo o MPF (Ministério Público Federal), o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, interferiu nas estruturas de fiscalização do Ibama após Bolsonaro pressionar sua equipe devido à destruição de maquinário usado por grileiros na Amazônia.
Indícios apontam para incêndios criminosos no Pantanal
Sobre as queimadas no Pantanal, Bolsonaro comparou a situação brasileira com a dos Estados Unidos.
O nosso Pantanal, com área maior que muitos países europeus, assim como a Califórnia, sofre dos mesmos problemas. As grandes queimadas são consequências inevitáveis da alta temperatura local, somada ao acúmulo de massa orgânica em decomposição.”
A Polícia Federal, porém, suspeita de ação criminosa nos incêndios. A corporação deflagrou uma operação para apurar a responsabilidade pelas queimadas na região.
Na reserva particular do Patrimônio Natural Sesc Pantanal, na região de Barão do Melgaço, em Mato Grosso, peritos apontaram que o incêndio aconteceu por queima intencional de vegetação desmatada para criação de área de pasto para gado. (Uol)
Redação