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Apostas online: Como funciona o mercado das “bets” que convocou Virgínia Fonseca à CPI

O papel dos influenciadores digitais na expansão do mercado de apostas

O lucrativo e polêmico universo das apostas esportivas entrou de vez na mira do Congresso Nacional — e das páginas policiais. Nesta terça-feira (13/5), a influenciadora Virgínia Fonseca, com mais de 53 milhões de seguidores no Instagram, foi ouvida pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Bets no Senado Federal. O depoimento é mais um episódio de uma investigação que vai além da publicidade online: investiga os impactos sociais e econômicos das “bets” na vida de milhões de brasileiros e possíveis vínculos com crimes financeiros.

Instalada em novembro de 2024, a CPI das Bets apura a influência do mercado bilionário das apostas online no orçamento das famílias brasileiras, além de investigar possíveis relações com esquemas de lavagem de dinheiro. O setor, que ganhou impulso nos últimos anos com a popularização de plataformas como Blaze, Esportes da Sorte e outras, operou por muito tempo em uma espécie de limbo legal até a regulamentação aprovada no fim de 2023.

A publicidade sob investigação

A convocação de Virgínia é simbólica do novo foco da CPI: o papel dos influenciadores digitais na expansão do mercado de apostas. Durante a oitiva, a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), relatora da comissão, conduziu os principais questionamentos, abordando temas como responsabilidade social, contratos publicitários e o uso de perfis falsos ou simulados para promover as plataformas.

Virgínia admitiu manter contrato com a casa Blaze, atualmente divulgada em suas redes. Ela explicou que utiliza uma conta específica fornecida pela empresa para produzir o conteúdo promocional, mas que se trata da mesma plataforma disponível ao público comum. A influenciadora também confirmou que familiares, como o cantor Zé Felipe, seu marido, e sua mãe, já participaram dos vídeos promocionais.

Apesar da aparente transparência, Virgínia usou o direito ao silêncio, garantido por habeas corpus do ministro Gilmar Mendes (STF), ao ser questionada sobre o maior valor recebido em contratos com casas de apostas. “Me reservo ao direito de ficar calada”, disse. Ainda assim, garantiu que todos os valores foram declarados à Receita Federal e negou ter recebido porcentagens atreladas às perdas de usuários — prática conhecida como “cachê da desgraça”.

Milhões fora das bets?

Ao tentar afastar a imagem de que teria enriquecido com o setor, Virgínia afirmou que seu sucesso financeiro tem outras origens. Segundo ela, sua empresa própria faturou R$ 750 milhões em 2023. “Eu já tinha 30 milhões de seguidores quando comecei a divulgar [bets]. Eu não fiquei milionária com isso”, declarou.

A influenciadora também disse incluir alertas em seus conteúdos, como a proibição para menores de idade e mensagens sobre os riscos de vício. Ainda assim, reconheceu o impacto das críticas e afirmou estar repensando a continuidade das parcerias com o setor: “Se realmente faz tão mal para a população, por que não proíbem de vez?”.

Regulamentação tardia e zona cinzenta

Parte do debate gira em torno da regulamentação das apostas online no Brasil. A prática foi legalizada em 2018, ainda durante o governo Michel Temer, por meio da Lei 13.756/18, que autorizou as apostas de quota-fixa. No entanto, o setor só foi efetivamente regulamentado com a sanção de nova legislação no fim de 2023, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Esse vácuo legal foi o que permitiu a proliferação de casas de apostas e a explosão de contratos com influenciadores — com pouca transparência, fiscalização frágil e alto apelo comercial.

Apostas, vício e crime: o que está em jogo

O avanço das “bets” preocupa autoridades por diversos motivos: o estímulo ao endividamento de famílias vulneráveis, a presença de menores de idade nas plataformas e a possível infiltração de organizações criminosas nesse mercado. Para a relatora da CPI, o problema não está apenas no vício em jogos, mas na estrutura que sustenta esse sistema.

“Estamos falando de bilhões circulando sem controle, sem rastreamento e, em alguns casos, sem impostos devidamente recolhidos. O papel dos influenciadores não é menor nesse cenário”, afirmou Thronicke.

A CPI pretende convocar mais nomes do meio digital e esportivo nos próximos meses. Já se especula a oitiva de outros artistas, streamers e ex-atletas que se associaram às casas de apostas.

O que são as “bets” e como funcionam

As “bets”, ou apostas esportivas, são plataformas online onde o usuário pode prever resultados de partidas de futebol, basquete, vôlei, entre outros esportes, apostando dinheiro real. A chamada aposta de quota-fixa — já legalizada — permite que o jogador saiba quanto poderá ganhar caso acerte o palpite. No entanto, há modalidades que envolvem jogos de azar, cassinos virtuais e roletas, que operam à margem da legalidade ou da regulamentação.

Com a nova lei sancionada em 2023, as empresas do setor devem obter autorização para funcionar, pagar impostos e seguir diretrizes de publicidade responsável. Mesmo assim, muitos sites ainda operam fora do Brasil ou sem seguir as exigências da nova legislação.


Riscos

A convocação de Virgínia Fonseca mostra como o debate sobre apostas online já ultrapassou os limites do marketing digital. A pauta entrou no radar do Congresso, das autoridades judiciais e do debate público. Em jogo está não apenas o futuro da regulamentação, mas a proteção de milhões de brasileiros diante de um setor que mistura entretenimento, risco, dinheiro fácil e, cada vez mais, suspeitas graves.

Por Damata Lucas – Imagem: Reprodução Freepik

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