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Futuro governo vai enfrentar menor orçamento em 10 anos na saúde

Por Mariah Aquino/Metrópoles

Em meio aos trabalhos da equipe de transição do governo eleito, especificamente na área de Saúde, um dos temas que recebe especial preocupação é o Programa Nacional de Imunizações (PNI). Desde 2016, as taxas de cobertura vacinal para diferentes vacinas têm caído cada vez mais.

Em meio aos trabalhos da equipe de transição do governo eleito, especificamente na área de Saúde, um dos temas que recebe especial preocupação é o Programa Nacional de Imunizações (PNI). Desde 2016, as taxas de cobertura vacinal para diferentes vacinas têm caído cada vez mais.

A redução do orçamento também compromete a sustentabilidade de diversos segmentos do Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com as consultorias de orçamento do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, o valor previsto no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2023 na área da Saúde é o menor dos últimos 10 anos.

Relatórios da saúde

Estes são alguns dos principais desafios a serem enfrentados pelo governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na saúde pública. Na última semana, o Tribunal de Contas da União (TCU) entregou a representantes do grupo técnico da transição na saúde os relatórios de fiscalização da Corte na área.

No diagnóstico, não foi possível avaliar o cumprimento das metas de imunização, devido à falta de dados disponibilizados pelo governo Jair Bolsonaro (PL), além da ausência de boletins epidemiológicos que investiguem a morbidade e a mortalidade da síndrome pós-Covid-19.

O TCU também apontou desperdício de recursos, estimado em R$ 13 bilhões ao ano; a eficiência dos hospitais públicos apresenta média de apenas 28%.

A Corte de Contas identificou “indícios de insustentabilidade no SUS”. Nesse sentido, o tribunal assinalou que “há uma tendência de aumento da necessidade de recursos em razão da mudança do perfil demográfico da população e de aspectos inflacionários, o que, associado ao cenário fiscal desfavorável à ampliação de gastos, pode agravar ainda mais a desassistência verificada na atualidade”.

“Vamos trazer de volta o Zé Gotinha”

Motivo de orgulho nacional em outros momentos, as coberturas vacinais caem gradativamente, ano após ano. Doenças como sarampo e poliomielite – que constituíam antigas ameaças, antes erradicadas – voltam à espreita.

Levantamento feito pelo Metrópoles com informações do Datasus mostra que, em 2015, a cobertura atingiu 84,88%. Em 2016, passou para 78,87%; o percentual caiu novamente no ano seguinte, com 67,44%.

O índice subiu levemente em 2018, com 71,89%; desde então, não apresentou valores maiores que 70%. Em 2019, a cobertura vacinal foi de 69,91%. Em 2020, primeiro ano da pandemia de Covid-19, registrou-se 62,13%. Já no ano passado, a cobertura ficou restrita a 55,10%.

Na quinta-feira (24/11), o presidente eleito reuniu-se com a equipe de transição na saúde e representantes de organizações como Fiocruz, Instituto Butantan, Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems).

Após receber informações sobre a falta de recursos, o petista falou em recompor o orçamento da pasta, “trazer de volta o Zé Gotinha e fazer do Brasil, mais uma vez, referência mundial em vacinação”.

Negacionismo

De acordo com o senador Humberto Costa (PT-PB), o novo governo promoverá uma grande campanha de vacinação, “acompanhada de uma série de precauções e cuidados, principalmente porque hoje há muita dúvida de parte da população sobre as vacinas e os problemas que elas podem causar – resultado desse trabalho de negacionismo”.

O grupo técnico de saúde da transição enxerga “potencial risco” em falta de vacinas no próximo ano. Arthur Chioro, médico sanitarista e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), apontou que nenhuma das oito vacinas fornecidas pelo Butantan tem programação para 2023.

Orçamento

O Boletim de Monitoramento do Orçamento da Saúde, feito pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (Ieps) em parceria com a Umane, comparou o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2023 e 2022 e analisou as quedas nos valores reservados para diferentes programas do SUS.

Em valores totais, as maiores perdas foram registradas no programa Pró-Residência Médica e em Área Multiprofissional – que receberá investimento de R$ 922 milhões, 60% a menos que no ano anterior; e na Promoção, Proteção e Recuperação da Saúde Indígena e Estruturação de Unidades de Saúde e Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) – com subsídio de R$ 910 milhões, 60% a menos que no ano anterior.

O programa Mais Médicos, criado em governo petista e alvo constante de críticas de Bolsonaro e seus aliados, perdeu R$ 366 milhões (31% do valor reservado em 2022).

Maior perda proporcional

A Rede Cegonha de Atenção Materno-Infantil acumulou a maior perda proporcional: R$ 18 milhões, o que equivale a 63% menos que em 2022. O Programa de Implantação e Funcionamento da Saúde Digital e Telessaúde no SUS perdeu R$ 26 milhões, também 63% menor que o ano anterior.

Arthur Aguillar, diretor de políticas públicas do Ieps, aponta a seriedade representada pelos cortes em programas como o de saúde indígena e enfrentamento ao HIV/Aids.

“Esse tipo de restrição pode definir quem tem acesso ao tratamento contra Aids, e definir se será possível fornecer transporte em regiões remotas para comunidades indígenas. É muito grave, define quem vive ou morre no país”, destaca Aguillar.

Estrutura do SUS e políticas públicas

Secretário de Saúde do Espírito Santo e presidente do Conass, Nésio Fernandes destaca a importância de implementar o Planejamento Regional Integrado (PRI), programa pactuado com o Ministério da Saúde, por meio da Resolução CIT nº 37/2018, mas ainda não executado.

A proposta apresentada no PRI define a divisão do país em 115 macrorregiões de saúde. Cada uma deve ter ao menos 700 mil habitantes – com exceção da Região Norte, onde o mínimo é de 500 mil. A ideia é fornecer “serviços de alta complexidade para cada uma”, garantindo que cada região não fique desassistida em estruturas de saúde para atendimentos básico e especializado.

Aguillar reforça: “Precisamos efetivar a regionalização da saúde, uma forma de coordenação entre municípios. Há muita desigualdade em serviços de saúde”.

Fernandes ressalta que é essencial, neste momento, adotar respostas pragmáticas para “melhorar o acesso ao atendimento especializado, à vacinação e a outros serviços”. “Existem alternativas bem avaliadas e já conhecidas que podem ser adotadas pelo novo governo.”

O representante do Ieps relembra também que, com o aumento das despesas obrigatórias, a capacidade de investimento do Ministério da Saúde para o desenvolvimento de políticas tem sido mínimo.

“É preciso tornar o financiamento do SUS mais progressivo, pensar em como instituir modalidades de financiamento regionais”, diz Aguillar.

Outro programa fundamental, na visão de Aguillar, é a Estratégia de Saúde da Família (ESF). “Mais de 70 milhões de pessoas não são cobertas pela ESF. É o lugar da base, é lá que vai acontecer o pré-natal, a vacinação, o manejo das condições crônicas. É necessário investir em quantidade e qualidade.”

Fonte: Metrópoles

Foto: Ricardo Stuckert

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