
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou neste domingo (27/4) a intimação do deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) para que, no prazo de 48 horas, apresente esclarecimentos sobre declarações relacionadas ao uso de emendas de comissão. A medida foi tomada no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) que discute a transparência na destinação de recursos públicos.
A decisão foi motivada por reportagem publicada pelo jornal O Globo, que revelou uma estratégia do Partido Liberal (PL) para pressionar o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), no contexto da divisão de emendas parlamentares. De acordo com o jornal, Sóstenes teria afirmado que o PL poderia passar a controlar integralmente os recursos das comissões presididas pelo partido, rompendo um acordo que distribui 30% dos valores para o partido que comanda a comissão e os 70% restantes para outras legendas, conforme decisão da presidência da Câmara. Os recursos em disputa somariam cerca de R$ 6,5 bilhões.
O suposto movimento do PL seria uma forma de pressionar a Câmara a votar um projeto de anistia para condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023.
Ao justificar a intimação, Flávio Dino destacou que as declarações atribuídas ao deputado podem indicar a repetição de práticas incompatíveis com a Constituição Federal, em especial com os princípios da transparência e da rastreabilidade de recursos públicos. Dino lembrou que o Congresso Nacional, ao aprovar a Lei Complementar nº 210/2024, estabeleceu regras específicas para o uso das emendas de comissão, exigindo que elas sejam destinadas a ações de interesse nacional ou regional, com aprovação formal das comissões e registro em ata.
“O aprimoramento constante do primado da transparência, rastreabilidade e eficiência tem norteado a conduta desta Relatoria”, escreveu Dino na decisão. O ministro ainda reforçou que o objetivo do pedido de esclarecimentos é garantir o cumprimento das normas estabelecidas no plano de trabalho pactuado entre os Poderes Legislativo e Executivo, homologado pelo STF em fevereiro, que busca extinguir práticas conhecidas como “orçamento secreto”.
O despacho de Dino determina que, após a manifestação do deputado, o processo volte imediatamente para avaliação de eventuais medidas adicionais necessárias à proteção do interesse público e ao respeito à legislação.
Reação de Sóstenes Cavalcante
Após a divulgação da decisão, o deputado Sóstenes Cavalcante se manifestou nas redes sociais, afirmando que parlamentares eleitos “não se curvam a ameaças” e rejeitam qualquer tentativa de “censura” ou “intimidação” por parte do Judiciário. “O Parlamento é livre. Deputado eleito pelo povo não se curva a ameaças de ministro do STF. Fazemos política com transparência, dentro da Casa do Povo. A luta pela Anistia é justa, constitucional e legítima”, declarou.
O parlamentar também utilizou as hashtags “#RespeitoÀSeparaçãoDePoderes” e “#ParlamentoLivre” em sua postagem, reafirmando a defesa da autonomia do Poder Legislativo. À imprensa, Sóstenes informou que ainda não foi oficialmente notificado da intimação, mas que se manifestará no momento oportuno.
Contexto
Flávio Dino é relator no Supremo de ações que têm como foco o aprimoramento da transparência na destinação das emendas parlamentares. O debate sobre as chamadas “emendas de comissão” ganhou destaque após a descoberta de práticas que concentravam a distribuição de verbas públicas de forma opaca, culminando na implementação de novas normas para garantir mais publicidade e rastreabilidade dos recursos.
Além da intimação de Sóstenes, Dino também determinou, na última sexta-feira (25), que a Câmara dos Deputados e o Senado Federal informem, em até dez dias úteis, como será feito o registro público dos autores das emendas de comissão e de bancada.
O tema permanece no centro das discussões entre os Poderes, em um momento em que a transparência e a integridade dos processos orçamentários são cobradas com maior rigor pela sociedade e pelas instituições de controle.
Edição: Damata Lucas – Imagem: Lula Marques