Maduro conquista quase todos os governos regionais em eleições contestadas na Venezuela
Eleições são marcadas por baixa participação, repressão a opositores e tensão crescente com a Guiana por causa de Essequibo

O presidente venezuelano Nicolás Maduro e seu partido, o PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela), conquistaram uma vitória esmagadora nas eleições legislativas e regionais realizadas neste domingo (25). A votação, marcada por um amplo boicote da oposição e por denúncias de repressão política, resultou em mais um fortalecimento do chavismo no poder, aumentando as preocupações sobre o futuro da democracia no país e seus reflexos no cenário latino-americano.
Segundo dados oficiais divulgados pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), o PSUV venceu em 23 dos 24 estados venezuelanos, perdendo apenas no estado de Cojedes, no centro-oeste. Nas listas nacionais para o legislativo, a coligação governista obteve 82,68% dos votos, enquanto os resultados por círculo eleitoral ainda estão sendo apurados.
A participação popular, de acordo com o CNE, foi de pouco mais de 42%, número contestado por diversos setores da oposição, que denunciaram falta de transparência e intimidação nas ruas.
Clima de repressão e intimidação
O pleito foi realizado sob forte aparato de segurança. Mais de 400 mil agentes foram mobilizados para garantir a realização da votação. Ao longo do processo eleitoral, pelo menos 70 pessoas foram detidas, entre elas o líder opositor Juan Pablo Guanipa, aliado de María Corina Machado. Ele foi preso na sexta-feira anterior à eleição, acusado de integrar uma “rede terrorista” que, segundo o governo, pretendia sabotar o processo.
A repressão, no entanto, não se restringiu ao dia do pleito. Os distúrbios pós-eleitorais que ocorreram após as eleições presidenciais de 28 de julho deixaram um saldo de 28 mortos e mais de 2.400 detenções. De acordo com dados oficiais, 1.900 dessas pessoas já foram libertadas.
Oposição dividida entre o boicote e a participação
Grande parte da oposição decidiu não participar das eleições, alegando falta de garantias mínimas para um pleito justo. “Não vou votar porque votei em 28 de julho e eles roubaram as eleições. É uma farsa”, afirmou Candelaria Rojas Sierra, 78 anos, aposentada em San Cristóbal, ao se dirigir à missa, onde disse que rezaria “pela Venezuela”.
Do exílio, o ex-candidato Edmundo González Urrutia, que se declara vencedor das eleições presidenciais de julho, classificou o pleito como uma “declaração silenciosa de resistência” e reafirmou a busca por mudanças democráticas no país.
Já María Corina Machado, principal liderança da oposição, voltou a convocar os militares a se posicionarem: “O país exige que as Forças Armadas cumpram seu dever constitucional. Agora é o momento de agir”, declarou em vídeo divulgado nas redes sociais.
Em contrapartida, o ex-candidato presidencial Henrique Capriles, eleito na lista nacional, defendeu a estratégia de permanecer no jogo institucional: “O que é melhor? Ter uma voz e lutar na Assembleia ou deixar tudo nas mãos do governo?”, questionou.
Disputa internacional: a questão de Essequibo
Em meio às disputas internas, o governo Maduro também deu mais um passo na escalada de tensão com a vizinha Guiana. O regime chavista realizou eleições para escolher um governador e oito deputados para a região de Essequibo — território rico em petróleo que é administrado pela Guiana, mas reivindicado historicamente pela Venezuela.
A votação, organizada nas fronteiras e não no próprio território de 160 mil km², elegeu o almirante Neil Villamizar como “governador do Essequibo”. A decisão provocou reação imediata do presidente guianense Irfaan Ali, que classificou a medida como uma “ameaça direta” à soberania de seu país.
Maduro respondeu com veemência: “Mais cedo ou mais tarde, Irfaan Ali terá que se sentar comigo para discutir e aceitar a soberania venezuelana. Vamos recuperar o Essequibo”, afirmou o presidente.
Isolamento internacional e riscos para a região
A vitória do chavismo em meio a denúncias de fraude, repressão e perseguição política acirra o isolamento diplomático da Venezuela e gera preocupação entre governos e organismos multilaterais na América Latina. A condução autoritária do processo eleitoral e a insistência de Maduro em reivindicar o Essequibo criam um clima de instabilidade que ultrapassa as fronteiras do país.
Com uma economia em colapso, um regime cada vez mais fechado e uma oposição fragmentada entre o boicote e a participação institucional, a Venezuela segue em um impasse político que desafia as instituições regionais e coloca em xeque os princípios democráticos no continente.
Edição: Damata Lucas – Imagem: Leandra Felipe / Agência Brasil