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Fraude bilionária no INSS derruba ministro e amplia crise política no governo Lula

Apesar da rápida nomeação de Wolney Queiroz para a pasta, a oposição mantém a pressão

A queda do ministro da Previdência, Carlos Lupi, nesta sexta-feira (2), após o escândalo de fraudes bilionárias no INSS, revela não apenas uma crise pontual, mas um problema antigo e estrutural da máquina pública brasileira: o histórico de irregularidades no sistema previdenciário. Apesar da rápida nomeação de Wolney Queiroz para a pasta, a oposição mantém a pressão com a articulação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para aprofundar as investigações sobre os descontos indevidos em aposentadorias.

Carlos Lupi, que vinha tentando se blindar politicamente ao destacar que não era alvo direto das investigações, deixou o governo após a Polícia Federal (PF) e a Controladoria-Geral da União (CGU) identificarem fraudes estimadas em R$ 6,3 bilhões. Esses valores representam um rombo significativo, não só em cifras, mas em impacto social: aposentados e pensionistas de baixa renda foram as principais vítimas, tendo parte de seus benefícios subtraídos indevidamente.

A demissão de Lupi marca a 11ª mudança ministerial no terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, uma taxa elevada de substituições em apenas um ano e meio de governo, algo que naturalmente alimenta a narrativa de instabilidade usada pela oposição. O governo, por sua vez, age para conter o desgaste e tenta sinalizar compromisso com o rigor administrativo, ao mesmo tempo em que mantém os acordos políticos essenciais para a governabilidade.

Um problema que se arrasta há décadas

As fraudes no INSS não são novidade. Desde a década de 1990, sucessivos governos vêm enfrentando denúncias que vão desde a concessão irregular de benefícios — por meio de falsificação de documentos, inclusão de beneficiários fantasmas e aposentadorias rurais fraudulentas — até esquemas complexos envolvendo servidores públicos e intermediários externos.

No governo Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, foram identificados pagamentos a “mortos” em vários estados, o que levou à implantação de mecanismos como o cruzamento de dados com certidões de óbito e a obrigatoriedade de recadastramento. No governo Lula, durante os primeiros mandatos, o próprio INSS já havia sido alvo de operações da Polícia Federal, como a famosa Operação Pororoca, em 2004, que desarticulou quadrilhas de concessão fraudulenta de benefícios.

Apesar de avanços tecnológicos, como a digitalização de processos e o uso de biometria, o problema persiste: as fraudes migram de acordo com as brechas deixadas pelos sistemas de controle. Nos últimos anos, o foco deslocou-se para os descontos indevidos feitos diretamente nos contracheques dos aposentados, muitas vezes em nome de associações e sindicatos desconhecidos pelos beneficiários.

Os desafios do novo ministro

Com a chegada de Wolney Queiroz ao comando do ministério, Lula espera não apenas estabilizar politicamente o PDT — partido ao qual pertence o ex-ministro Lupi —, mas também dar uma resposta administrativa rápida. Wolney, que já atuava como número dois na pasta, esteve presente em reuniões onde os primeiros alertas sobre os descontos indevidos foram feitos, o que levanta questionamentos sobre o grau de responsabilidade que ele próprio pode ter no atraso das respostas.

Ele terá de trabalhar lado a lado com Gilberto Waller Jr., recém-nomeado presidente do INSS, e com a Advocacia-Geral da União (AGU), encarregada de garantir o ressarcimento às vítimas. Mais do que resolver a crise, Wolney precisará reconstruir a credibilidade do sistema previdenciário — uma missão delicada em ano pré-eleitoral, quando o governo já enfrenta forte polarização no Congresso.

Oposição quer ampliar o desgaste

Mesmo com a troca ministerial, a oposição vê na CPMI uma ferramenta para manter o tema vivo e pressionar Lula em outras frentes. Segundo o líder oposicionista no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), a instalação da comissão será uma condição para o funcionamento normal do Congresso. Na prática, a CPMI pode abrir espaço para uma devassa mais ampla nas contas e nos processos do INSS, incluindo a convocação de ex-gestores e servidores para prestar depoimentos.

Além do impacto institucional, o caso desperta alta sensibilidade social: levantamento da AtlasIntel mostra que 85% da população apoiava a saída de Lupi mesmo antes de sua demissão. Esse dado reforça a percepção de que, independentemente das disputas partidárias, o governo precisa entregar resultados concretos para reconquistar a confiança dos eleitores.

Lupi, um histórico marcado por denúncias

A situação de Carlos Lupi também não é inédita. Em 2011, ele deixou o Ministério do Trabalho no governo Dilma Rousseff após denúncias de cobrança de propina e uso irregular de aeronaves. Na época, adotou tom desafiador — chegou a dizer que só sairia “abatido à bala” — mas acabou renunciando dias depois. Agora, mais de uma década depois, repete o mesmo roteiro: nega responsabilidade direta e afirma torcer para que os culpados sejam punidos.

O desfecho da crise atual terá efeitos que vão além do Ministério da Previdência. Ele pode redefinir o espaço do PDT no governo, impactar as articulações eleitorais de 2026 e, sobretudo, abrir uma discussão séria sobre os mecanismos de controle e fiscalização no INSS — uma autarquia historicamente vulnerável a fraudes que afetam diretamente a população mais frágil do país.

Edição Damata Lucas – Imagem: Marcelo Camargo

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