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Depoimento de ex-comandante da Aeronáutica reacende debate sobre bastidores golpistas no pós-eleição de 2022

A declaração contrasta diretamente com o depoimento prestado dois dias antes pelo próprio general Freire Gomes

O tenente-brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior, ex-comandante da Aeronáutica, confirmou nesta quarta-feira (21), em depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF), que o general Freire Gomes, ex-comandante do Exército, chegou a ameaçar dar voz de prisão ao então presidente Jair Bolsonaro (PL), caso ele tentasse colocar em prática um plano de ruptura institucional após a derrota nas eleições de 2022.

A declaração contrasta diretamente com o depoimento prestado dois dias antes, na segunda-feira (19), pelo próprio general Freire Gomes, que negou ter feito qualquer tipo de ameaça. Já Baptista Júnior foi categórico: “Confirmo [a ameaça], sim, senhor. O general Freire Gomes é educado e não falou com agressividade ao presidente, mas foi isso que ele disse. Com calma e tranquilidade: ‘Se você tentar isso, eu vou ter que lhe prender’.”

O episódio teria ocorrido durante uma reunião no Palácio da Alvorada, em que o então presidente discutia, junto a comandantes das Forças Armadas, alternativas como o uso da Garantia da Lei e da Ordem (GLO), além de decretos de Estado de Defesa ou Estado de Sítio — dispositivos constitucionais extremos que, segundo relatos, estariam sendo cogitados para contestar os resultados eleitorais.

Baptista Júnior reforçou que não houve uma ordem de prisão efetiva, mas sim uma advertência clara de que haveria consequências caso Bolsonaro insistisse em qualquer tentativa de golpe. Segundo ele, a fala de Freire Gomes foi firme, ainda que sem tom agressivo.

Outro momento delicado relatado pelo ex-comandante da Aeronáutica diz respeito a uma nova reunião, em 14 de novembro de 2022, quando o general Paulo Sérgio Nogueira, então ministro da Defesa, teria apresentado uma minuta de decreto golpista. Baptista afirmou que, ao entender a natureza do documento, recusou-se a sequer lê-lo e deixou a reunião imediatamente. “Perguntei: esse documento prevê a não posse do presidente eleito? Se sim, eu não admito sequer receber esse documento”, relatou.

Essa não foi a primeira vez que Baptista Júnior depôs no âmbito das investigações sobre uma suposta tentativa de golpe. Ele já havia citado anteriormente a existência de reuniões com conteúdo que, segundo sua avaliação, ultrapassavam os limites do debate democrático. Seu nome consta tanto na lista de testemunhas da Procuradoria-Geral da República (PGR), quanto nas defesas de Bolsonaro, do almirante Almir Garnier (Marinha) e do próprio general Paulo Sérgio Nogueira.

O depoimento, que inicialmente estava marcado para segunda-feira (19), foi remarcado após a defesa do ex-comandante informar que ele se encontrava fora do país.

Reflexões e implicações

As revelações de Baptista Júnior reforçam uma narrativa que, até pouco tempo, muitos consideravam especulativa: a de que, nos bastidores da transição de governo, setores do alto comando militar resistiram a pressões para endossar uma tentativa de ruptura democrática. Mais do que um confronto de versões, os depoimentos expõem o grau de tensão institucional que se viveu no fim de 2022 — e mostram que nem todos os militares estavam alinhados com os planos mais radicais do entorno do então presidente.

Se confirmadas, as informações revelam não apenas a existência de um plano de golpe, mas também que ele foi barrado internamente, por resistência de figuras-chave dentro das Forças Armadas. A história ainda está sendo escrita, mas os novos capítulos indicam que os desdobramentos judiciais e políticos podem ser mais profundos do que se imaginava.

Edição: Damata Lucas – Imagem: Roque de Sá/Agência Senado

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