
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse nesta segunda-feira (24/3) que o atual Governo tem tomado providências e adotado práticas que reduzem os gastos públicos e dão mais eficácia aos investimentos. Entretanto, operadores do mercado financeiro não conseguem enxergar, porque isso “não está no radar” da Faria Lima.
“Às vezes, uma pessoa que está em uma mesa de operações (financeiras) funciona muito por impulso. E ela só vê as coisas que ela conhece. E às vezes está passando um elefante e (o operador) não está enxergando”, afirmou Haddad, durante debate promovido pelo jornal Valor Econômico, em São Paulo.
Para sintetizar os limites do campo de visão desses operadores, Haddad lembrou que o mercado financeiro errou em R$ 80 bilhões (para mais) as previsões para o déficit primário do Governo Federal no ano passado. O ministro destacou ainda que essa previsão superlativa foi feita antes dos graves problemas climáticos enfrentados pelo Rio Grande do Sul, que exigiram dispêndio inesperado de recursos por parte da União. E que, mesmo assim, o superávit real foi melhor do que o imaginado: déficit real de 0,1% do PIB, contra 0,8% do previsto pelo mercado.
Ao responder pergunta sobre o grau de exigência que o Governo impõe sobre si no controle de gastos – se buscaria em 2025 atingir o centro da meta de resultado primário ou se contentaria com o limite de 0,25% da banda proposta pelo arcabouço fiscal –, Haddad usou novamente como exemplo o resultado do ano passado: “Se eu tivesse gastado R$ 17 bilhões a mais, eu ainda estaria dentro da banda”. Segundo ele, o objetivo é perseguir a meta cheia.
Ao citar resultados de medidas que o Governo tem adotado, Haddad destacou que a atual gestão retirou R$ 1,5 trilhão da lista de riscos previsíveis de gastos extras oriundos de decisões judiciais pendentes. “Na Faria Lima, ninguém vai notar isso”, observou. Essa lista compõe anexo da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
Riscos judiciais afastados
Segundo o ministro da Fazenda, essa diminuição de riscos decorre do princípio jurídico do consequencialismo adotado pelo Governo Lula. “Quando você toma uma decisão judicial, você tem de conhecer as consequências dessa decisão”, explicou. “A liminar que conseguimos no Supremo para compensar a desoneração da folha é um exemplo disso”, comentou.
Em setembro do ano passado, após ação movida pelo Governo, o STF determinou que o Congresso encontrasse alternativas de arrecadação que suprissem a isenção do INSS sobre a folha de pagamentos de 17 setores empresariais.
Como consequência daquela decisão, “conseguimos disciplinar o Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos) e a reoneração gradual dos privilegiados com a medida”, lembrou Haddad.
O ministro disse que a adoção do consequencialismo se deu em janeiro de 2023, quando decreto do presidente Lula criou o Comitê de Risco Fiscal de Natureza Judicial e incluiu o próprio Haddad em sua composição. Segundo ele, fazer parte desse comitê permite que ele defenda junto aos tribunais os riscos de decisões relativas a tributos. “Depois deste decreto, nós não perdemos mais nenhuma grande causa nos tribunais superiores”, disse.
Haddad destacou que embate mais recente se deu na semana passada, quando a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal votou por validar a existência de limites para a dedução de gastos com educação no Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). Pelas regras atuais, o limite máximo é de R$ 3.561,50. Ação da OAB pedia o fim de quaisquer limites. “Teríamos R$ 115 bilhões de rombo nas contas públicas se tivéssemos perdido”, disse o ministro.
Na opinião dele, não foi a composição do STF que mudou, e sim a postura do Governo. “O que mudou foi a atuação do Executivo em mostrar as consequências para a sociedade que uma mudança de jurisprudência poderia trazer para o País.” Haddad disse ainda que mudanças como essas são mostras de um “comportamento republicano”.
Governo responsável
Em 2019, o gasto médio do Governo em comparação ao PIB era de 19,5% do PIB. “No ano passado, mesmo considerando as despesas com o Rio Grande do Sul, o gasto foi de 18,7%. Tiramos quase 1% do PIB”, afirmou o ministro da Fazenda. Haddad reclamou do tom alarmista adotado por setores da mídia e pelo mercado financeiro para tratar do Governo Lula. Em 2018, lembrou, o déficit primário do Governo Federal fechou em 1,7% do PIB. “E ninguém dizia que o Brasil ia quebrar por causa disso”, lembrou.
Para ilustrar a diferença de tratamento e reafirmar a espécie de cegueira seletiva do mercado financeiro, o ministro destacou ainda o rombo aberto nas contas públicas por ocasião da derrota do Governo Temer na chamada “tese do século”. Haddad considera que a derrota daquela gestão no STF foi falta de empenho ou de preparo da equipe econômica. Em março de 2017, o STF julgou e decidiu pela exclusão do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) da base de cálculo do PIS/Cofins.
“Quando a tese do século foi julgada, abriu-se um rombo de R$ 1 trilhão, e os indicadores de dólar e de juros não mudaram. Como isso é possível”, questionou. Haddad disse que já fez essa pergunta a vários economistas que trabalhavam em operadoras financeiras naquela época, e que nunca obteve resposta convincente. Seria a tal cegueira do mercado financeiro, portanto.
Mais crédito, mais inflação?
O ministro falou também sobre possíveis resultados do novo empréstimo consignado, chamado Crédito do Trabalhador, sobre a inflação. Haddad disse que o principal objetivo da nova linha é retirar pessoas do endividamento excessivo e que se trata de uma medida estrutural, de longo prazo. “Não tem nada a ver com conjuntura. Não podemos confundir as coisas. Temos que criar condições microeconômicas mais saudáveis para o Brasil”, disse, referindo-se à democratização do crédito.
Após o debate, o ministro publicou nas redes sociais um desabafo sobre a repercussão de afirmativa que fez. “Estão tentando distorcer o que falei agora em um evento do Valor. Disse que gosto da arquitetura do arcabouço fiscal. Que estou confortável com os seus atuais parâmetros. E que defendo reforçá-los com medidas como as do ano passado. Para o futuro, disse que os parâmetros podem até mudar, se as circunstâncias mudarem, mas defendo o cumprimento das metas que foram estabelecidas pelo atual governo.”
Fonte: Agência Gov – Imagem: Diogo Zacarias/MF