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Governo Lula e gestão Tarcísio firmam acordo para reassentamento de famílias da favela do Moinho

Moradores receberão até R$ 250 mil para aquisição de imóveis; protestos, denúncias e impasse sobre renda seguem no centro do debate habitacional

São Paulo – Em meio a uma crise marcada por protestos e conflitos com a polícia, os governos federal e estadual anunciaram nesta quinta-feira (15) um acordo para viabilizar o reassentamento das cerca de 800 famílias que vivem na favela do Moinho, localizada na região central da capital paulista.

O plano prevê a concessão de até R$ 250 mil por família para compra de imóveis. A verba será dividida entre a União, que entrará com R$ 180 mil, e o governo de São Paulo, com R$ 70 mil. A proposta é parte de um esforço conjunto das gestões do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) para dar solução a um impasse que se arrasta há anos.

A favela do Moinho ocupa um terreno de propriedade federal, situado próximo à estação Júlio Prestes, em uma área de alto valor imobiliário. A intenção do governo estadual é transformar o local em um parque urbano, dentro de um projeto de revitalização do centro da cidade. Para isso, negocia a cessão da área com a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), que havia suspendido a doação do terreno em abril. À época, a SPU criticou o uso de força policial para desocupações e a demolição de moradias ainda habitadas — acusações negadas pela gestão Tarcísio.

O anúncio do acordo foi feito após reunião entre o ministro das Cidades, Jader Filho, a ministra substituta da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Cristina Mori, e o secretário estadual de Habitação, Marcelo Branco.

Entraves no reassentamento

Desde abril, o governo paulista deu início ao cadastramento de famílias interessadas em deixar a comunidade. O plano oferece uma carta de crédito de até R$ 250 mil por meio da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), vinculada ao estado. No entanto, cerca de 30% dos moradores alegam não ter renda suficiente para se qualificar para o financiamento, mesmo com os subsídios oferecidos.

Para as famílias com a menor renda permitida (equivalente a um salário mínimo, atualmente em R$ 1.518), o governo pode subsidiar até 70% do valor do imóvel. Mesmo assim, muitos não conseguem assumir os custos restantes.

Moradores também denunciam que foram orientados a declarar rendimentos superiores à sua renda real para se enquadrar nos critérios do programa habitacional. Uma lista com assinaturas de pessoas que alegam ter sido induzidas a falsear sua renda está circulando entre os residentes, o que pode gerar novos questionamentos sobre a transparência e a execução do programa.

Outro ponto de tensão é a oferta de imóveis localizados na região central. De mais de 1.000 unidades disponíveis ou em produção, pouco mais de 100 ficam próximas do centro e já estão prontas. A maioria dos imóveis está em áreas periféricas. A gestão estadual, no entanto, afirma que essa é uma situação temporária e promete entregar unidades suficientes no centro em até dois anos. Enquanto isso, famílias reassentadas recebem auxílio-moradia de R$ 800 mensais.

Conflitos e insegurança

A tensão no local aumentou nos últimos dias. Na quarta-feira (14), pelo terceiro dia consecutivo, moradores e a Tropa de Choque da Polícia Militar entraram em confronto. Houve uso de balas de borracha por parte dos policiais, barricadas erguidas por manifestantes e lançamento de pedras. A entrada da comunidade foi incendiada.

O confronto afetou também o funcionamento do transporte público: a circulação de trens da Linha 8-Diamante da ViaMobilidade, entre as estações Júlio Prestes e Palmeiras-Barra Funda, foi interrompida por horas e só foi normalizada no início da noite.

Apesar da resistência, o governo de São Paulo afirma que 90% das famílias aceitaram participar do processo de cadastramento, e que mais de 180 já deixaram o local.

Histórico e contexto

A favela do Moinho é uma das últimas ocupações remanescentes na área central de São Paulo, marcada por décadas de negligência do poder público. A comunidade já enfrentou grandes tragédias, como incêndios em 2009 e 2011 que deixaram mortos e desabrigados, além de promessas não cumpridas de urbanização e regularização fundiária.

Com o novo acordo entre os governos federal e estadual, espera-se uma reconfiguração do debate, mas o sucesso do plano dependerá da efetiva inclusão das famílias mais vulneráveis, do respeito aos direitos humanos e da oferta real de moradias em áreas com infraestrutura adequada e acesso a serviços públicos.

Edição: Damata Lucas – Imagem: Ricardo Stuckert

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