GeralNacionaisPolítica

Pacheco e Lira adotam medidas contraditórias sobre Covid no Congresso

Dois dias após o Senado liberar o uso da máscara, a Câmara dos Deputados revogou nesta quarta-feira (16) a obrigatoriedade da utilização do item de proteção facial em suas dependências.

Apesar da flexibilização, as duas Casas mantiveram o sistema semipresencial, que permite que os parlamentares participem das sessões e votem à distância, de forma remota. A medida contrasta com a decisão das máscaras, mas facilita a aprovação de projetos de interesse do governo.

O ato da mesa, assinado pelo presidente Arthur Lira (PP-AL), é datado de terça-feira (15) e foi publicado na edição do Diário da Câmara desta quarta.

Tradicionalmente, o quorum nas sessões da Câmara e no Senado é o principal entrave para que votações sejam “tratoradas”, que é o jargão legislativo usado para descrever a aprovação acelerada de temas de interesse das bases governistas e dos presidentes das duas casas.

Ou seja, com a facilidade de reunir remotamente um maior número de deputados e senadores, essas maiorias conseguem superar de forma mais tranquila eventuais opositores e minorias, que se utilizam de mecanismos do regimento para tentar derrubar ou atrasar sessões com baixa ou média presença.

Conforme a Folha mostrou em junho do ano passado, o sistema virtual de votação, além de facilitar os interesses do governo e das maiorias legislativas, é passível de fraude.

Parlamentares relataram em caráter reservado, na ocasião, que a maioria dos políticos passava as sessões virtuais com o áudio e o vídeo de seus aparelhos celulares ou computadores desligados o tempo todo, sendo que alguns estariam colocando assessores para votar em seus lugares —atitude proibida e que configura quebra de decoro parlamentar.

Na segunda-feira (14), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também revogou artigo que determinava a obrigatoriedade de utilização de máscaras de proteção facial em todos os espaços do Senado, “sem prejuízo das recomendações de isolamento social e daquelas expedidas pelas autoridades sanitárias”.

Os anúncios seguem a flexibilização das normas sanitárias no Distrito Federal. Na última quinta-feira (10), o governador Ibaneis Rocha (MDB) desobrigou o uso de máscaras em ambientes fechados, três dias após liberar a utilização da proteção em locais abertos.

Na Câmara, apesar de prorrogar o sistema semipresencial, Lira estabeleceu restrições à atuação dos deputados que estão remotos. Somente os parlamentares presentes nas reuniões e no plenário podem usar o microfone, por exemplo.

Em votação na última quinta-feira (10), o líder do Novo, Tiago Mitraud (MG), decidiu tentar barrar a votação do projeto que buscava conter o aumento de combustíveis por causa das restrições impostas a quem não estava presencialmente no plenário.

“Nós não concordamos com esse sistema que está sendo adotado. Fica claro, como estamos vendo, que o direito de falar, o direito de parlar, que é a essência do Parlamento, não está sendo concedido a simplesmente 500 deputados, que não estão aqui nesta noite”, afirmou.

Insatisfeito com o sistema semipresencial, o líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes (MG), também criticou a manutenção dos trabalhos híbridos.

“[A liberação da máscara] Reforça a nossa tese da volta dos trabalhos presenciais, pois as pautas que estão sendo votadas são muito importantes para o país”, disse. “A partir da semana que vem estamos em obstrução total até a volta presencial dos trabalhos.”

O PT é o maior partido de oposição no Congresso.

Obstrução é o jargão legislativo que indica o ato de tentar barrar determinada votação usando mecanismos do regimento para atrasar ou derrubar as sessões por falta de quorum.

Em nota, Lira defendeu a decisão. “O Senado e o GDF [Governo do Distrito Federal] retiraram a obrigatoriedade da máscara. Por que a Câmara deveria continuar? Vale ressaltar que o sistema do Senado é totalmente virtual, e na Câmara o nosso é híbrido, onde o deputado pode vir ou não.”

Procurado, o Senado informou que o ato do Presidente foi editado a partir da decisão do governador Ibaneis Rocha de retirar a obrigatoriedade do uso de máscara no Distrito Federal, “onde está a sede do Congresso Nacional (Decreto nº 43.072/2022), em consonância com a decisão Supremo Tribunal Federal de 2020, de que compete aos governantes e prefeitos a regulamentação de medidas de prevenção e enfrentamento à Covid-19 nos respectivos territórios.”

“O Senado Federal é a casa das federações e, como tal, preza e respeita a autonomia entre os Entes Federativos”, escreveu Pacheco em nota.

Para o infectologista José David Urbaez Brito, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia, a decisão do Congresso não faz sentido. “Não é hora de retirar máscara em espaços fechados, porque é onde acontece a transmissão. É contraditório [liberar máscara e manter o sistema semipresencial], do ponto de vista do manejo da Covid-19.”

Ele avalia que o país ainda não apresenta condições para desobrigar o uso de máscaras em locais fechados. “Máscara é horrível, desconfortável? É. Mas tem uma estratégia toda, tem que ver como fazer a evolução disso, há um passo a passo. Da forma como foi feito eu acho extremamente precipitado”, ressaltou.

Na avaliação dele, ainda não houve tempo suficiente para confirmar se é seguro retirar as máscaras em locais fechados. “Você viu o que acontece, primeiro se adota medida e depois há um recuo. Não é só o efeito do Carnaval, tem que analisar qual o efeito de retirar nos lugares abertos, qual o efeito da vacinação.”​

Fonte: Folha de São Paulo

Artigos relacionados

Botão Voltar ao topo