Quatro ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) defenderam nesta quarta-feira, 16, a anulação de escutas telefônicas numa investigação que tinha como juiz o hoje candidato à presidência Sergio Moro (Podemos) e como procurador Deltan Dallagnol. O caso ocorreu bem antes da operação Lava Jato, do qual participaram Moro e Dallagnol. Trata-se de uma investigação conduzida em 2004 contra os empresários uruguaios Isidoro Rozenblum Trosman e Rolando Rozenblum Elpern, respectivamente pai e filho.
O julgamento será retomado nesta quinta-feira, 17. O caso também servirá para o STF definir uma regra geral de como deve funcionar o sistema de grampos telefônicos em investigações judiciais. Cinco ministros da Corte entendem que as escutas podem ser renovadas consecutivamente, desde que haja concordância do juiz responsável e motivação para a manutenção dos grampos.
A ação analisada pelos ministros foi apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF), que recorreu da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de anular todas as provas obtidas pela dupla Moro e Deltan Dallagnol. Os empresários uruguaios que tiveram os telefones grampeados eram investigados pelo MPF em 2004 na chamada Operação Pôr do Sol, que apurou envio de dinheiro ao exterior, irregularidades na concessão de financiamento do BNDES e dívidas fiscais superiores a R$ 150 milhões.
O caso gerou mais de trinta inquéritos e chegou a condenar dez pessoas à prisão, em 2006. Os empresários foram acusados de crimes contra o sistema financeiro nacional, corrupção, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, dentre outros.
Os ministros da 6ª Turma do STJ consideraram abusivas as interceptações telefônicas autorizadas por Moro, a pedido de Dallagnol e do procurador Orlando Martello Júnior, por conta do tempo em que os grampos ficaram ativos, sem haver uma “motivação válida”. Ao se manifestar nesta quarta, o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, argumentou que a duração alongada das escutas é também a favor da defesa e não gera abusos.
O relator da ação, ministro Gilmar Mendes, argumentou que o fato relevante a ser considerado no caso “é a falta de fundamentação das renovações” autorizadas por Moro. Segundo o decano do Supremo, as motivações apresentadas pelo ex-juiz “foram padronizadas, basicamente reproduções de modelos genéricos, que não podem ser consideradas como legítimas a embasar a restrição de direito fundamental (privacidade) por sucessivas renovações”.
O decano citou ainda o fato de Moro não ter mencionado nas decisões os resultados alcançados com as escutas e que justificariam a necessidade de prorrogação do prazo. O seu voto foi seguido pelos ministros André Mendonça, Kassio Nunes Marques e Dias Toffoli. Ao divergir, Alexandre de Moraes disse que a tese proposta por Gilmar Mendes pode acabar com a interceptação telefônica. “Isso retroativamente vai anular grandes condenações de tráfico de drogas e corrupção. Não é possível cotejar algo que ainda não se teve”, disse Moraes.
Para Moraes, não é possível exigir que a cada renovação o juiz apresente as provas coletadas, que justificariam a necessidade de prosseguir com esse método de investigação. O ministro defendeu, ainda, que não houve excesso no período de dois anos em que Moro manteve as escutas. “Não vislumbro aqui nenhuma irregularidade, nenhum abuso, nenhuma desproporcionalidade. As decisões foram analisadas”, afirmou.
Ao Estadão, Dallagnol afirmou que a discussão no Supremo se baseia em questões processuais em que “mais uma vez” a Corte “se encaminha para anular um caso envolvendo corrupção e casos gravíssimos contra a sociedade, com base em formalidade”.
Fonte: Estadão Conteúdo